terça-feira, 7 de abril de 2009

TUDO

Lili recebeu um merecido castigo este fim de ano: não ganhou presente de Papai-Noel. Eu dei o castigo e não sei quantas vezes chorei um pouquinho antes do Natal por isso. Eu me perguntava se não estava sendo severa demais, afinal de contas ela sonha com o Natal [e com os presentes] desde junho! Ela acredita em Papai-Noel, o que pensaria com este castigo? Isso eu me perguntei demais. Entretanto, sempre me vinha à mente os motivos do castigo [que prefiro silenciar] e via ser justa a decisão.

Antes do castigo eu dei avisos, conversei, expliquei os motivos de se agir desta maneira e avisei que numa reincidência haveria castigo pior. E houve e cumpri com minha palavra. Mesmo assim, me senti de castigo junto com ela. Senti que eu estava sendo punida juntamente com minha filha porque, ao não lhe dar o presente, eu não veria seu rostinho se iluminar, não ouviria seu riso, seu espanto ao ver que ganhou "magicamente" o que estava escrito na carta endereçada ao bom velhinho.

Mas tudo aconteceu de forma diversa ao que eu previ. Ela não recebeu o presente, mas não se entristeceu, seu rosto continuou iluminado e seu riso o mesmo. A menina está feliz, não fez mais malcriações e não sentiu falta de presentes no dia seguinte. E aí, determinadas fichas começaram a cair. Criamos necessidades falsas o ano inteiro! Criamos desejos desnecessários e quando não os realizamos nos frustramos! Temos tudo! Dei-me conta de que ela não sentiu falta do presente porque ela possui mais do que precisa e que a falta do presente no Natal negou-lhe apenas o excesso dos desejos. Ela me perguntou antes do castigo: "mãe, o que eu peço no Natal? Eu não tenho idéia do que vou pedir, porque eu já tenho isso, isso, isso..." e desenrolou uma lista de "issos" que ela já possuia e eu não me dei conta de que seus desejos estavam sendo realizados com uma facilidade aleijadora!!!

Com medo de fazê-la sentir-se infeliz pela falta do presente, eu fiquei de castigo junto com ela, sofrendo por lhe negar um objeto do desejo. Eu pude ver que deveria ter ficado triste caso lhe negasse o objeto da necessidade! Eu sempre quis criar minha menina de forma moralmente correta, utilizando a ética cristã e não tinha percebido o quanto entrei na ética consumista onde se está feliz quanto mais de possui, se tem e não se "é", simplesmente. Graças a Deus, o que venho pregando aos ouvidos de Lili, deve ter surtido um efeito positivo; porque ela não se sentiu a pior das criaturas por não ter ganho aquele presente de Natal. Eu é que adiei atitudes, porque eu é que alimentei como mãe o ideal errado do consumo. Sinceramente, ao dar um presente a ela, eu estava alimentando o meu ego infantil; estava dando presentes à Saminha de 9 anos que há dentro de mim e que tem aquela sede de mais e mais... Como tantos outros pais e mãe do nosso tempo eu passava minha herança de desejos não satisfeitos a minha filha e neste Natal ganhei de presente a chance de fazer diferente.

E sim... nós já temos tudo! Olhem a sua volta e vejam o quanto de supérfluo já possuem. Contem quantas coisas vocês têm e quantas delas vocês REALMENTE precisam. Minha filha está jogando o video-game que ganhou no dia das crianças, andando na bicicleta que ganhou no ano passado, ouvindo o MP4 que ganhou de aniversário e não tem mais sentidos para gastar com os objetos que possui! Eu não quero entorpecer minha filha entupindo seus braços de posses que ela não poderá usar, eu não quero distraí-la do que é essencial, porque ela possui sim tudo o que de material precisa, mas ainda falta muito [muito como eu!] para ter TUDO do que seu espírito se alimente!

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