Cortei o cabelo essa semana.
Passei semanas desejando isso, pesquisei, vi milhares de fotos, mil cortes
diferentes, mas todos voltados para o que eu realmente queria fazer: cortar
curto. Eu pegava a minha franja na frente do espelho e colocava de um jeito pra
saber se ficaria legal. O resultado era sempre bom e eu já estava decidida que
seria isso mesmo.
Geralmente, quando eu me decido
por uma coisa - apesar da demora para isso – não volto mais atrás e no caso do
cabelo é mesmo impossível voltar atrás depois da coisa estar feita. E da
maneira que escolhi não teria outro jeito a não ser esperar crescer, rezar,
fazer penitência e tal. Eu me apaixonei pelo corte curto e há muito anelava o
sonho de fazer leveza na cabeça deixando para trás alguns gramas de pelo cheio
de química.
Um namoro longo, repleto de
olhares atenciosos, de detalhes minuciosos e eu prestei bastante atenção para
não haver arrependimentos. Fui lá e fiz! Escolhi uma cabeleireira infértil que
cobrou meus dois ovários e o útero pelo corte e me dei toda a sua tesoura. Ela
veio rápida e sedenta, quase sem me dar chances para desistir. Pegou meus poucos
fios e os desfez.
Saí do salão com aquela sensação
de que tinha todo um bairro me olhando. De cabelos molhados fiz passos mais
apressados, doida pra chegar em casa e dar meu jeito no cabelo. Louca pra
escová-los e ajeitá-los ao meu modo. Já no meio do caminho eu comecei a
entender Robert Pattinson
perfeitamente. Nasceu em mim uma solidariedade sem tamanho a ponto de me
irritar ao ver qualquer piadinha a respeito da traição sofrida por este ator.
Não falem de Robert! Só eu e ele sabemos o que é ser traído depois de um
namoro longo: eu não queria ver nenhum vizinho. Entrei em casa com a sensação
de estar me ocultando dos holofotes e flashs das câmeras perversas de Hollywood.
Rezei nos últimos segundos antes de conseguir me arremessar pelo portão de casa
à dentro, pedindo a Deus que sumissem todos os meus conhecidos e que nenhum
olhar menos discreto pudesse fazer considerações sobre meu novo look. Deus me
ouviu.
Consegui escová-los e só na base do chicote o leão que havia em mim [agora
representado em forma de juba] foi domado. Eu tremia igual a vara verde, suava
só imaginando como fazer para ir para o trabalho com aquela cara. Mas o pior
ainda estava por vir. Meu noivo me mandava mensagens a todo momento dizendo que
estava louco para me ver de cabelo cortado. Eu tive cólicas a tarde inteira
imaginando esse encontro. Como dizer a ele que aquela mulher-leoa era mesmo sua
noiva querida? Como dizer que não foram ladrões de cabelo que me roubaram a
aparência e sim que eu paguei por aquilo ali? Foi a tarde mais longa de minha
vida. Meus colegas de trabalho, gentis como sempre, me fizeram muitos elogios,
mas isso só me acalmou a ponto de conseguir desempenhar minhas tarefas. Eu
teria que sair dali às 19h e meu noivo viria me pegar no trabalho.
Quando deu 19 horas eu saí, peguei o elevador e desejei que ele tivesse
freios para retardar o instante do encontro. Pensei por dois segundos em
agarrar nos cabos de aço igual a um gato e não descer nunca mais – ou até que
eu voltasse a parecer gente. E ele estava no saguão, sentado numa poltrona e
olhando o celular; pensei “deve estar ligando pro SAMU”. Levantou a cabeça e quando
me viu, sorriu dizendo: “amor, você está linda!”. A partir deste momento eu
resolvi ser adepta da filosofia José Augusto: “mente pra mim, me ajuda a viver!”.