sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

VELOZES E ENTORPECIDOS

Rápidas informações, rápidos são os acessos a elas, rápido, todas passam e só lembramos delas na retrospectiva do ano que se finda. Muitas vezes nos perguntamos: "foi esse ano, foi?". Ou eu mesma me espanto - já tem 10 anos do atentado às torres gêmeas. É... o tempo está numa velocidade imensa e - digo eu - mórbida.
Assim como os obesos americanos, brasileiros, baianos, ricos, pobres, moradores de qualquer lugar, a vida tem produzido e engolido informações aos magotes. Produz-se todos os dias informações sobre todas as coisas; ou melhor, produz-se notícias sobre todas as coisas. Estudos? Não. Melhor afirmar que "os cientistas afirmam", assim fica com cara de verdade, ninguém tem tempo de verificar, tudo muda rápido demais e é isso aí. Obesos que engolem notícias, manchetes, chamadas, vinhetas e não se alimentam mais de conhecimento. E quem tem tempo, meu Deus? Se até de Deus esquecem. Mas lembram agora nessa mega sena da virada. Ai Deus, até tu, meu velho, virou notícia - que passa mais rápido na memória RAM e nem chega a entrar no tal HD.
E por falar em peso, produzimos toneladas de tudo nesta vida. Por que será que tenho ouvido notícias fazendo propaganda em toneladas sobre as coisas que produzimos? Sobre esta questão, um esclarecimento: notícias são propagandas de estilo de vida ideal, parecem que os infelizes escolhem as mesmas coisas para delas falarem enquanto lhes intere$$a. E mais um outro esclarecimento: produzimos mais do que precisamos de todas as coisas que temos. E voltando ao assunto: sobre informações também.
Não sei para que diabos eu quero saber de todas as coisas que nem gravo. E me dirão: para não ficar alienada, fora do mundo. Ahhhh pára com isso! Aliás: para. Passaram correndo pelo acento e o mataram e eu odeio isso.
Pois vou lhes dizer mais algumas coisas e se minha inspiração acabar eu termino o texto antes de dizer todas, mas essa eu lhes direi: a velocidade é a nossa nova droga. Viciante, causa dependência física, química, o diabo a 4. Não nos deixa desligar celulares, notebooks, televisores, a mente, a tomada, os olhos das últimas novidades - que num piscar de olhos viram antepenúltimas, mais uma semana e já viram primeiras. Ligadões!!!
Tradição? Que nada! A onda é atualidade. Mas... para onde corremos?
Para que batemos o carros por excesso de velocidade, por que perdemos o tracejado das curvas, por que nos embriagamos com o amanhã, por que tantas miragens? Vertigem entre prateleiras de cores vivíssimas! E quando fui me dar conta do que eram emos e de que estes diabretes usavam preto, eles já amanheceram coloridos!
E já que falei tanto no diabo, posso dizer que o "new" diabo é a própria velocidade. E como todo bicho-ruim que se preze, ele nos tira o melhor: o tempo do amor, que é em slowmotion, o tempo de cair os dentes dos filhos, o tempo de curtir as férias, o tempo de sentar à beira da praia com os amigos, o tempo do luto, o tempo de sono, o tempo do beijo, o tempo da respiração.
O ano está nas últimas e eu percebi que a enquete que fiz aqui e coloquei como limite de participação o último dia do ano, passou depressa demais. A gente supõe um futuro e ele já está em nossos narizes, com a velocidade do espirro que damos. Senti que 365 dias foram 365 horas, mas o que vi, li, soube este ano foi infinitamente maior que a multiplicação dos dois números. E me pergunto aquilo que, automaticamente, muita gente se pergunta no dia 31/12 de cada ano: o que aprendi? Ou será necessário pedir, "para aí, volta um pouco mais, não peguei aquilo que passou correndo" - a Vida.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

CADÊ VOCÊ AMOR?

Acordei pensando em você, lembrando dos momentos em que te vi e como lindo é você! Tantas vezes tentei te descrever sem conseguir e tantas mais vezes eu tentarei e não conseguirei. Difícil falar de você, antigo conhecido.

Por sua causa quantas vezes chorei, só para depois saber que você nunca quis me fazer sofrer. Culpa minha que não sabia estar contigo. Briguei com muita gente por sua causa, pois acreditava que para te defender precisava gritar com alguém. E fiquei de mal de mim mesma por todas as vezes que tentei afastá-lo de mim. E sempre que assim agia eu descobria que era impossível te perder.

Confesso, porém, que às vezes te traio. Perdão! Ainda não sei ser completamente sua. Espera-me, um dia eu serei. Eu sei que serei, porque é inevitável não ser. Descobri que as coisas ficaram mais fáceis depois que te assumi e que você está em mim - não te arranco mais do peito. Se um dia o fiz foi por medo. Eu não sabia o que pensar, o que fazer, mas era tão fácil saber: você só precisa de entrega. Cega entrega. Plena entrega.

Então, saiba, aqui estou para entregar-me inteira a você - toma-me! Faz desta alma pequena o teu inteiro reflexo, pois não quero nunca mais ser eu mesma; e no dia que me fizer inteira, serei toda você - Amor.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

"MEU AMIGO"

Como deve ser a vida daqueles que não têm a quem chamar de "meu amigo"?
Deve ser triste e dessa tristeza não sei, pois dos caminhos onde andei
Sempre os tive comigo.
Às vezes estavam ali escondidos de mim numa ajuda silenciosa
Eu, muito orgulhosa, achei que consegui sozinha
Hoje reconheço que de solidão jamais padeci;
Se gritei e não os via não é que estava no vago
Mas mergulhada no lago de minha própria melancolia
Cegava-me de medo ou fugia.
Permiti-me ser cuidada e de cuidados ser o alvo
Aprendi que nem sempre posso ser flecha
Aceitar amor é mais que merecer
É saber abrir a alma, ser humilde e receber.
Aprendo todos os dias com meus amigos
Que a alma que não se permite ser abrigo
Pode ter todas as coisas do mundo
Mas vive uma vida inteira sem nada ter.


{Dedico estas palavras aos visíveis Marcelo, Irlena, Vania e Luiza}

PALAVRA É QUERER ALMA

Eu queria escrever palavras que juntas dissessem o que vai em minha alma, numa inteireza de tal sorte, que eu me fizesse compreendida. Eu queria pronunciar de tão exata forma os segundos, os momentos, as circunstâncias e os instantes que molhasse todos eles de minha intensidade. Eu queria estar nas pessoas de um jeito que suas almas lascassem-se em portas sem chaves para mim. E eu queria bem profundamente amá-las, bem alto, bem forte, bem bonito de maneira tão aguda e ampla que me tornasse um infinito. Eu só queria...
Sem tantas palavras, vou repetindo versos, elaborando falhas, casando as rimas, suprindo as frestas; embora nem chegando perto de ser dicionário, acho que escrevo - destas letras - bons textos. Para quem reclame de ausência da modéstia, eu clamo pela lógica: se com meus quase 30 anos nada de bom tivesse posto no mundo, valeria viver mais 30?
Deixando plasmarem-se alguns lapsos, sei que a engrenagem do tempo em mim e às vezes no que vejo do tempo dos outros, pede um pouco mais de óleo; mas tenho dado ao tempo a verdade que posso - vivo riso e choro quando chegam. Aos outros o tempo que agarram e molham.
Ah!... as almas! Indecifráveis passagens secretas; tão difusas e concretas, com pesos tão distintos que sem força, amor e instinto como albergá-las tantas? Mas ando longe de reclamar, tenho tido almas por onde passo e paro. Não todas - que fique bem claro - ainda!
Não posso com todas as palavras, tempos e almas, mas em todas estas a que tenho acesso, nelas infinito-me!

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

PISTAS

Vem, vem depois de mim. Segue as pistas que te deixo, o cheiro que exalo, as reações que em ti disparo e vem, vem depois de mim.

Treme, treme ao me ver. Mostra a tua surpresa, tropeça em minha direção, sua e sonha em pegar em minha mão. Trema de emoção!

Ri, ri de felicidade. Sorri gostosamente aliviado, ri sem saber o que dizer, sorria quando eu disser que gosto de você. Se sentir vergonha, sorria mesmo assim.

Se nada disso você fizer, quando eu passar, não vou olhar para o lado nem para trás. Não vou jogar meu charme para vê-lo se perder nos olhos de um incapaz de me perceber. Não vou confessar que gosto de você. Não vou vestir as saias coloridas, nem despir-me inteira em pele e medos. Eu vou fingir que não sei que sonha em me ter. Se não vier, tremer e sorrir, como saberei que é você?

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

QUEM EU SOU [ESSE FOI PRO ORKUT]


Eu sou alguém a quem "errar" não matou. Sobrevivi aos meus próprios erros para descobrir que errarei mais adiante. Sobrevivi aos erros dos outros para descobrir que errarão comigo outra vez. Juntando estas duas coisas descobri que somos farinha do mesmo saco. O que difere é a atitude frente às feridas causadas e que causamos.

Eu sou alguém que não matou a saudade. Suspiro com lembranças de um passado distante. Suspiro por ter amigos distantes. Suspiro por ter distante tantas coisas de mim. Mas respiro aliviada ao descobrir que o essencial está comigo e porque não me recuso a formar laços, eles sempre estão embaraçando em meus pés, criando mais amigos, mais amores, mais saudades gostosas de sentir.

Eu sou alguém que não morreu de medo. Tenho um monte deles guardados em meu tapete, mas me propus a levantar a ponta do troço felpudo e agarrar uns medos pelo pescoço, encarar alguns e dizer: "Um dia eu te venço desgraçado! Por enquanto eu te escondo, mas já matei outros tantos de você; me aguarde!"

Eu sou alguém que morreu de rir. Há mais felicidade na vida do que supus encontrar. Já ouvi tantos kits de ditados e toda vez que comprei um deles, eu me ferrei. Essa coisa de "todo isso é assim" ou "todos os aquilos são cozidos" é bem coisa de gente mais medrosa que eu. Decidi curtir todas as minhas dores até o fim da picada e depois dar risada de minha cara encolhida achando que a dor não iria passar nunca! Passa! Mas somos nós que decidimos se passa com vidro moído ou vaselina.

Eu sou alguém que a tristeza não matou. Já vi a cara do bicho e é pior que briga de foice no escuro. Tristeza é feia demais! Mas a encarei de vez em quando e descobri que sou frágil, o suficiente para não ficar só nas horas em que ela bate na porta de meu quarto. O suficiente para chamar um amigo e dizer "help". O suficiente para optar mais pela alegria.

Eu sou alguém que não morreu de solidão. Bem que a danada tentou, mas no último round eu me descobri sendo a melhor das minhas companhias. E cá pra nós: eu faço um belo par comigo mesma. A ponto de ter sempre gente querendo descobrir o segredo desta minha relação. É amor gente; só isso. Amor-próprio.

Mas lhes devo confessar: adoro morrer de amor. Coisa boa de se morrer! Quando a gente pensa que está fechando os olhinhos, o amor nos diz: "levanta daí, menina! Vai lavar esta cara! Você nasceu pra ser feliz!". E segue o amor me matando como nada antes o fez - de felicidade!

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

MUDO MUDAR

De laranja veste-se o dia e depois que quase todas as coisas se amornam, o sol vai se esvaindo por detrás das águas do mar e folga-se das gravatas o nó. Das gargantas, não. Algumas continuam com ele. Cada ser é um mundo, cada íntimo uma verdade, cada um com suas próprias mentiras, cada cantinho com seus segredos. Mesmo assim, nascem e morrem dias sobre todas as cabeças santas ou não. Parece haver um contrato que vela pela imutabilidade de algumas coisas.
Vão morrer pais, irmãos, mães, filhos, namoradas, inimigos, mas o sol vai nascer.
Vão nascer calos, filhos, bastardos, flores, espinhas, mas o sol vai se por.
Vão subir os preços, os juros, os aviões, os urubus, a pressão, mas tempestades vão cair.
Vão descer caixões em covas, madeiras cortadas, as portas de um comércio falido, a mão de um ignorante no dorso do filho, mas vai girar o mundo.
É assim todo o dia. Uma sinfonia de notas iguais compõe a não-mudança.
E enquanto rola o desdém dos segundos, do movimento das marés, do mover das nuvens com nossas alegrias e dores, a única coisa que muda tudo [que é de se mudar] é a nossa atitude frente as coisas.
Não faria sentido nascer e morrer tantas coisas, pessoas e dias se depois que o sol oscila imutavelmente entre o nascente e o poente, nada disso sirva para alimentar algo mais. 

terça-feira, 9 de novembro de 2010

SOM

Tic-tic dom-dom alguma coisa solta aqui
Pode ser parafuso, pode ser figuras sem adesivo
Tudo caído, tudo solto, tudo escondido
Ou algum detalhe que perdi


Péeen fon-fon se ocupam veículos lá fora
Pode ser pressa, pode ser por medo
Deviam ter saído mais cedo
Pra não se atrasar agora


Trim-trim alô, diz a ligação que fizeram
Pode ser da telefonia, ou pra casa errada
E mesmo com minha paciência acabada:
"Mas foi este número que me deram"


Trash puf pow, e o vidro escorregou
Um descuido de um segundo basta
Pra fazer a diferença entre pó e pasta
Ou da confiança que se quebrou.


Psiiiu e asserena o mundo vão
E quando todo mundo se deita
Um sufocado som à espreita:
As batidas do meu coração.

domingo, 7 de novembro de 2010

MAIOR QUE EU.

Dorme infante. Suspira um sonho qualquer, asserenado em teu travesseiro minúsculo. Pequenas narinas, olhinhos rasgadinhos de cílios delicados; agora está a brincar com os anjos, porque sorri e respira pelos buraquinhos do nariz e mostra o lugar de futuros dentes. As mãos em forma de bolinhas, fechadas se encontram com um pedaço da fralda, apertada que foi antes que pegasse no sono.
Teu cheiro é o mais caro perfume que suspiro a estourar os pulmões de felicidade, como pode se pensar na tristeza ao ver-lhe assim inocente? Seu nada saber acalma, seu nada poder convence, seu tudo precisar me move. E nem precisa pedir - ainda que soubesse - porque te amarei e servirei ainda que morta de cansada.
O que de mim fez? Eu que antes não pensava no tempo, não pensava em futuros, não lembrava dos outros, não sabia cuidar; depois de seu advento, aprendi a esperar, cuidar, doar e amar. O que fez de mim? Mãe.
O que posso dizer é que hoje, mesmo passados 11 anos, ainda consigo lhe ver um bebê que me fez ostentar um título que orgulho. Ainda hoje, quando dorme, eu admiro seu rostinho já cheio de espinhas. Ainda hoje e para todo o sempre será o único ser que, somente por existir, me ensinou a ser melhor.
E eu te amo - mais do que a todos os amores que um dia supus ou me atreverei a amar.

{Dedicado a minha filha}

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

FUTURO DO PRESENTE

Mando-lhe esta carta do passado. Um dia quando a encontrar, entenderá o porquê. Não consegui dormir e penso como te encontrarei. Como será você? Como serão seus olhos e o que eles me dirão? Você não é idealizado por mim nos detalhes mais passíveis de mudança - a imagem. Eu idealizo seu caráter, suas maneiras, seu jeito de me entender ou de se entregar pra mim. Não te conheço, mas já te pressinto. Nunca te vi, mas já te adivinho. 

E sei que de onde está, também é assim que se sente em relação a mim. Só não sabemos quando ou onde, mas sabemos que, sim, estaremos um dia frente a frente. E veja bem: eu já te amo. Não nos menores atavios, e sim nos indispensáveis detalhes. E quando me olhar, saberá que sou eu - porque o que há de ser tem a força de se impor. O seu amor por mim será indiscutível dentro de seu coração. Não te amarrarás nos preconceitos, na temporalidade, nos próprios medos. Será o homem que terá a força de me acompanhar. E a você, sem meias verdades, eu me entregarei.

Não sei porque se demora, mas sei que está no tempo correto. Não sei quando virá, mas tenho certeza que chegará na hora aprazada. Não sei onde nos veremos pela primeira vez, mas já são exatas as coordenadas deste local.

E quando ler esta carta [não idealizo em que tempo] saberá que eu te esperava e que guardava um tesouro onde se lê inscrito: "para ser entregue na alma". E lá estarei com o coração desembrulhado, sem papéis coloridos, sem fitas brilhantes, somente ele a te dar. Haverá um abraço e nada te perguntarei,  nem pedirei explicações por onde esteve antes que fosse meu.

Agora, numa garrafa brilhante, lanço ao mar esta carta e dormirei tranquila, porque sei que ela chegará ao seu destino.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

ESTRELA, POETA E VAGALUME

Eu sou uma estrela. Não a mais brilhante - há outras maiores no céu. Não a mais perfeita - meu brilho não aquece um sistema inteiro. E sei que o sonho de todo poeta é alcançar uma estrela, é guardá-la para si, mantê-la ao seu lado. Mas eu sou uma estrela e nem sei de que grandeza, e reconheço ser difícil me mirar e não parar um pouco admirado.

Mesmo assim, só Deus sabe o quanto eu já sofri para polir esta minha superfície. Quantos caminhos amarguei solidão até descobrir que quem tem um brilho de amor para si mesma, consegue de alguma maneira aplacar a solidão de si e dos que me rodeiam. Tantas e tantas vezes eu sonhei com o poeta a cantar melodias e me prometer os sonhos mais bonitos. Em tantas promessas acreditei, que não foram poucas as vezes que me fiz cadente, e depois descontente ao céu voltei.

Um dia, eu estrela, encontrei um poeta diferente e por ele me encantei. Ele sempre me cantou as mais inocentes poesias, as mais finas melodias e mesmo desafinado eu reconheci na voz daquele poeta um possível par. E era sim... se eu disser que nunca vi maneira de cantar uma estrela mais doce, não estarei mentindo. Ele não faria mal, não feriria, nem me pediria para menos brilhar. Esse poeta jamais quis ofuscar meu brilho e ao contrário disso, sempre me pediu para ser mais radiante.

Eu quis tanto o poeta para mim e era tão belo o nosso laço que esqueci que na terra chorava um vagalume. Chorava tristonho o vagalume perdido. Amava o poeta, o vagalume. E de longe eu vi que era um amor sentido, dependente, mas não menos profundo. Tantos vagalumes haviam amado o poeta, mas aquele era belo também. Senti um carinho por ele, um carinho de estrela. Senti que poderia acabar os céus que o vagalume amaria o poeta - e que lhe importavam as estrelas? Por um tempo, furiosa, eu tentei impedir. Finalmente, eu estrela, escolhera meu poeta e por que deveria ele querer o vagalume? Depois de um tempo eu entendi que o poeta e o vagalume podem se amar e se olhar no mesmo plano. Depois eu entendi que o poeta guiaria o vagalume e que sua luz pequena, através das noites sem lua e sem estrela, seria seu guia fiel. Por que subtrair o poeta ao vagalume? Eu estrela, sei bem o que é tanto procurar. Ele te segue de maneira tão bonita, poeta. Nas luzes de seu olhar há tanto "não me deixe" que terminei por decretar que te amarei como a estrela acima do horizonte, perto da lua, longe da terra, longe do mar; deixarei ao teu lado o nobre vagalume. De vez em quando, te peço, canta para mim. Pensa que tua estrela, o amor dela e o amor que por ela você tem não morreram - viraram uma eterna poesia. O vagalume mais de ti precisa, vês como ele bebe teu hálito. Eu irei silenciosa amá-lo sem mágoa, porque se parto desta maneira é por amá-lo como estrela.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

NOITE

O céu sarampeado de estrelas; é noite e noite de escuro febril: quente lá fora e tremendo por dentro - o frio da falta inflamada. O vento tosse na janela assoviando [em golfadas espaçadas] a solidão. O vidro do armário coriza, enquanto faço um chá de erva-cidreira.
Tudo está tentando se manter de pé, mas parece que o travesseiro chama o corpo a cair de cama. O tempo passando e espirrando lembranças...
Olho lá fora e vejo a natureza toda doída. Passarinhos escondidos, morcegos pelejando por algum fruto, corujas piando no dia dos mortos, casas silenciosas, poeira suspensa no vento rouco e a lua com seu cobertor de nuvens.
Eu sinto que algo gostaria de me contaminar, percebo vibriões se insinuando, vírus de medo, bacilos malditos da incerteza. Padecerei eu do mesmo mal da noite? Deixarei me arrastar à cova aberta para minha esperança?
Um frio na espinha. Coço os olhos, ajusto o foco, faço o sinal da cruz, bato três vezes na madeira, engulo um comprimido de vitamina C, faço uma prece, tomo meu chá, abro um sorriso, cato as melhores lembranças, recordo-me de todos "eu te amo" e vou dormir na certeza de que se a noite guarda suas provas sombrias, o dia me espera com a estrela da esperança, os morcegos dormindo, os pássaros cantando, a brisa perfumada e uma bicicleta. Lá fora pode morar a morte, mas aqui dentro vive a mais bela das verdades - meu amor me protege!

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

RIOS.

Rios paralelos que já nasceram como se tivessem bebido, antes, um pouco do mar. Gotejam em silêncio sulcando um caminho tímido. Levam tantas lembranças, lavam tantas dores e o medo que mil amores conseguiram plantar. Mas os rios não fazem milagres e quando secam é porque não há mais água que os alimente, não por falta de saudades que devam ser lavadas. Quando secam, ainda resta o vento assoviando entre seus leitos. E depois eles brotam novamente, são rios intermitentes numa vida que é perene de frustrações, alegrias, quedas e levantes - como a vida de tudo o que é vivo.
E se eles correm agora, mansos, finos, poderosos creiam que há motivos silenciosos no fundo da alma que os alimenta. Uma alma de magma em seu fundo, tantas vezes revoltosa, precisa de rios para esfriar seus ânimos, soprar suas feridas e lhe permitir a caminhada solitária.
Não é possível estancá-los, nem consolar a alma de magma, só se pode deixar que corram e se encontrem com seu destino. E depois de molhar a face, elas - que são rios - caem no vazio e salgam a saudade. Lágrimas.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

AREIA

Rolou de onde estava brilhante e alvissareira a pequena pedrinha de areia
Deixou-se arrastar pelo vento que enebria, pela mãozinha que cria
Castelos, bolos, pontes, rostos, rios e sereias
Inocente se permitiu moldar, escondida que estava das águas do mar
Foi revolvido o chão, cavado pelo plástico do brinquedo
E a areinha sem medo se deixou lavar
Colocada lá em cima na ponta do castelo
O sol lhe encontrava e seu brilho feliz se via
Porque nem nos seus mais belos dias
Chegou a pensar que do escuro de onde vivia
Podia outra vez avistar seu lar
Nascida do desgaste das rochas, polida no encontro das pedras
Ela que de cristal fino se fizera
Fora expulsa de seu leito por Hera
Megera ciumenta do fundo do mar.
Agora no topo ela estava e já não via a hora
De ser engolida pelos braços fortes da água
Que pode a tudo arrasar.
E não foi sem espanto e riso
Que vendo a espuma branca destruir o castelo
Feito por mãos de mover impreciso
Que a areia de alma rosa e cristal liso
Deixou-se beijar pela boca fria do mar
A criança chorava e ela partia
Sendo levada ao lugar de seu berço.
Criança mimada não chore, eu sou só areia
E tudo que te ofereço
Qualquer outro grão um dia pode te dar.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

SÓ TINHA DE SER COM VOCÊ

Tem certas canções que se deve tocar só uma vez. Tocar para uma só pessoa.
Tem certos momentos que só acontecem só uma vez. Com uma certa pessoa.
Há partes guardadas que só se acessam uma vez - por uma pessoa.
Há portas fechadas que só se abrem uma vez - por aquela pessoa.
Não adianta fazer repetir a música que o som não acontece. Não adianta ir ao mesmo lugar que o momento não se repete. Não adianta se dar de outras maneiras, nem entrar pelas janelas que não se repetem as pessoas, nem se escancaram os caminhos da alma.
A música - havia de ser pra você.
O momento - havia de ser com você.
As partes de mim guardadas - haviam de ser pra você.
As portas fechadas - haviam de te deixar entrar.
Se assim não fosse, não haveria mais azul-céu, não existiria mais paz-teus braços, não seria amor-seu cheiro. Só haveria céu, braços e cheiros. Só seriam mais azuis, paz e amores. Mas sem você nada disso se especializaria em mim.
Você que me conhece e quer mais me saber, entende que sempre fui sua e tudo isso havia de ser pra você.

{texto suspirado na música "Só tinha de ser com você", Tom Jobim}

terça-feira, 19 de outubro de 2010

EXPLICANDO

Como resolvi te amar? Não é um caminho fácil de descrever, portanto não o farei. Mas posso fazer assim: posso te dizer como te amarei. Amarei de uma maneira que nunca amei e como ninguém nunca deitou em meu coração.

Esta noite sonhei com você e a sensação é de que lhe entregava todo meu calor - mas eu ainda permanecia quente. Eu não morria de amar, porque amor nem mata. Eu tinha resolvido amar sem cuidados, sem movimentos pensados e palavras escolhidas. Então te amei. Acordei te amando. Morrerei deste jeito.

Não sentia frio e desde que te amo é mesmo assim - sem ventos fortes, sem mares revoltos, sem tremores de terra. Eu elegi você pra ser pra sempre e todos os fenômenos se dobraram a isso. Até a inveja e o medo. Até tudo de mais instável neste mundo, em mim e em você ganha calmaria.

Não são promessas: é verdade. Embora sinta vontade de subir escadarias, rezar novenas, acender velas e dizer amém; faria tudo isso para passar o tempo e estar contigo novamente. Cada vez que vejo você é como se todos os sentidos fossem perdidos junto com os meus. E isso não é poesia: é saudade. E os ritos diários ganham ainda mais automatismo quando você liga e diz: "tô pensando em passar aí pra te ver, vai fazer alguma coisa mais tarde?". Sinto vontade de responder: morrer de saudade quando você for embora. É que o tempo nesse momento pára. Quando estou contigo ele dispara e depois se arrasta na lama como um soldado em treinamento.

O meu simples jeito de amar é só um coração que resolveu abrir as cortinas e dizer pela primeira vez na vida: entre e fique à vontade. Mas fica pra sempre.

Entendeu?

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

MENINA DOS LAÇOS ROSADOS

Há anos um parque grande tinha chegado em sua cidade, mas ela não tinha tamanho, não tinha idade para usar todos os brinquedos. Nem podia andar no maior e mais brilhante de todos eles: a montanha-russa. Bem que tentou, com seu vestidinho impecável, entrar na fila e comprar ingresso - foi barrada, a pobrezinha. O máximo que havia lhe sobrado de emoção era andar na xícara de chá gigante, que cabia mais duas menininhas como ela. De gigante: nada.
O tempo passado, agora a menina tinha crescido e depois de amargar três anos à espera de andar na montanha-russa,  ela podia ir à desforra. Ela se esbaldaria. Seu vestidinho impecável iria voar, bater na testa, subir pra cabeça e a calcinha ia ser vista pelo parque inteiro. Daí, ao pensar em sua calcinha de babadinhos sendo vista por toda a cercania, ela tremeu de medo. Lembrou-se que durante aquele tempo inteiro tinha se comportado bonitinha, tinha sido uma mocinha, andado na xícara de chá que girava bem perto do chão, tinha engomado o vestido e recebido elogios. Todos passavam e diziam: "linda menina de lacinhos rosa de cetim", "que coisinha mais arrumadinha, nem mostra a calcinha nos brinquedos", "eu queria que minha filhinha fosse assim. Rebeca, por que você não imita a Menina dos Laços Rosados?". Ela se acostumara em ser a referência da xícara, se apegara ao chão, aos laços, ao vestido e ao bumbum bem guardado na calcinha de babados.
Onde, agora, o desejo de voar bem alto? Onde estava o sonho de sentir frio no estômago, ficar tonta e vomitar o algodão-doce? Onde os gritos, medo e gargalhadas? Não era o que a Menina sempre quisera? Agora ela podia, mas o que lhe algemava ao chão? Não tinha mais o moço do guichê lhe negando ingresso. Não tinha mais fita métrica lhe barrando a estatura. Não tinha nem mais vontade de rodar no mesmo lugar e ver a mesma paisagem passando na xícara. Mas tinha as mães das meninas sem laços, de calcinhas à mostra, tinha a referência da xícara de chá, tinha os elogios ao seu bom comportamento no parque [porque ninguém jamais houvera visto sua calcinha; era até um mistério e motivo de apostas: tinha a Menina de Laços Rosados algum suporte para segurar o vestido?].
E mais tinha: que ela precisava escolher entre viver seu sonho de andar no melhor brinquedo do parque ou se embriagar no resto do líquido entorpecente daquela xícara no chão, que de tanto rodar lhe deixara tonta por todos estes anos. Tinha que ela bem sabia que sua maior vontade era arrancar aqueles laços do cabelo, botar a saia na cabeça e mostrar a calcinha para quem no parque quisesse ver. E, na verdade, todos no parque estavam tão contentes em suas escolhas que nem viam a calcinha de ninguém; isso era coisa de mamães insuportáveis que tentavam barrar suas filhas felizes.
Anos mais tarde eu soube: a calcinha dela era azul.

sábado, 2 de outubro de 2010

CONTANDO SEGREDOS

Saudades de você e do bem que me quer. Como pode, meu Deus, amar-se tanto uma mulher? Elas são esquisitas, choronas, dengosas e frágeis [nem todas], mas deve ser porque são cheirosas, macias, risonhas e inteligentes. Vai saber, né? Por isso é que sinto saudade de você, porque você consegue me amar do jeito que sou: mulher. Às vezes - menina. Com esta memória de passarinho, que esquece de datas e se lembra de cantar. 
Estou sentindo seu cheiro, sabia? Parece mágica. Estou, realmente, sentido o seu perfume, como se a saudade conseguisse transportar máteria. Na verdade, eu sempre soube que saudade transporta muita coisa, inclusive, pedaços de meu coração. Ah! Mulheres são exageradas. Mas você ama, né?
Eu tô triste e feliz e porque sou mulher não consigo explicar o porquê de nada disso. Nem adianta tentar colocar tudinho numa prateleira e racionalmente discernir motivos para este misto de sentidos; você sabe que eu derrubo tudo, que confundo sua arrumação, que estrago seu tapete fazendo minhas colagens e você só sorri. E num sei pra quê lembrei-me de seu sorriso. Agora é que perco meu pinguinho de juízo e sem juízo assim, deste jeitinho, é que sinto sua maior vontade de me proteger. Sei que pensa assim: "vou abraçá-la até que ache o tino", daí eu não acho mesmo pra ficar agarrada em você.
Mas quem te protege sou eu; quando acha que já sabe das respostas eu te mostro meu senso de orientação e o mapa de cabeça para baixo. Das coisas que não quis ver, das coisas que nem quis saber e das outras que te sonegaram - eu sabia. E é por isso que meu colo é infinito, para que mais ninguém te encontre.
Vou lhe fazer um pedido e quero que anote aí [como se fosse preciso pedir]: não vamos brincar de segredos, porque me despi dos mistérios assim que me vi em seus olhos. Depois disso eu também me pergunto: como pode, meu Deus, amar como uma mulher?





sexta-feira, 1 de outubro de 2010

AQUELE ABRAÇO!

Abraço é engraçado. Lembro sempre mais dos abraços que dos beijos. Beijo é pequeno e abraço é gigante. É corpo todo, é um mundo inteiro que se abre e se encontra. Lembrança... saudade... cabeça no ombro, pé no pé, os braços selados por detrás dos corpos e respiração de "te achei". Sem lá fora, sem mundo todo, sem mais quem passe na porta, sem mãe, sem pai, sem outros alguéns - só aquele abraço. E eu te amo ao pé do ouvido.
Estou sentindo a falta do abraço e parece que vou sentir sempre esta falta, ainda que o tenha todos os dias [um dia]. Abraço mata e dá sede de mais abraço. Engraçado que sentindo sede e soltando água; vai entender a saudade!
Como é que alguém pode, meu Deus, viver tanto tempo sem abraçar? Não estou falando daquela coisa social de cumprimento vão. Não. Eu estou falando do enlace de alma e de um querer tão intenso que faz o coração correr a gargalhadas. A mão esfria, o sorriso fica nervoso e dançam os olhos [nos olhos]. Momento cri-cri-cri porque não se precisa das palavras e nem se sabe o que dizer e sabendo não há necessidade. Abraço rouba tudo: ar, segredos, medos, dúvidas, certezas.
E num dia destes receberei aquele abraço certeiro que transforma meio num inteiro, que transmuta rio em mar. E é aí que mora a graça do abraço: são dois corpos em direções opostas, mas almas que vão para o mesmo lugar. 

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

JOÃO E MARIA - DAS CARTAS DE SETEMBRO.

Hoje encontrei-me algo assim: perdida em ti. Sentei-me ao teu lado, ouvi o silêncio das árvores, o batuque das vozes, o assovio dos deuses - era ali o recanto que nos escolheu. Falei de planos, falei que eles servem, mas não para tudo. Coisas existem que despejam em nossos planos uma pitada de "e agora?" e quando vemos já estamos improvisando uma nova felicidade. Mas tudo isso, meu amor, é escolha. Diante da vida - eu disse e você sabe - não se encolha!

Nem te peço para encarar o sol de frente; sem rayban não dá! Vezes há que é bom andar olhando o chão. Noutro dia, achei 40 reais e comprei sorvete [você adora]. Mas não é sempre que se acha grana no chão, tem dia que é só grama, tem dia que é só rastro, tem dia que é só passo e outro que é só pão - os que Joãozinho jogou e os desgraçados-passarinhos-esfomeados comeram. Eu não disse? João tinha planos, mas foram destruídos por bicos famintos e delgados. Não os queira mal, como eu. Aliás... e pensando bem, eu não odeio mais os pássaros. Eles inventaram um novo destino aos meninos e acredite que a vida fará o mesmo com você.

Erram sempre o nosso nome e isso é muito engraçado, porque por mais expliquemos, ninguém se acostuma tão fácil com o diferente. Porque não quer ou porque não pode, há gente que fecha os ouvidos e escolhe não ouvir. Não faz isso, tá? Ouça! Abra os olhos e ouça a vida! Ela fala com as cores, com os mil e um amores e todos eles mais eu - que nunca vou me calar. Meu passo é grito e com minha voz de metro eu alcanço o que quiser e contigo eu aprendo a querer. Há pessoas de todo tipo, mas nenhuma delas é você. Seu destino pode ter mil passarinhos, mas não deixe de jogar o pão, porque - como eu prometi - estarei como Maria, sempre ao seu lado segurando sua mão.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O MUNDO É BOLA.


Ventam os destinos em pequenas porções de saudade. Buscam-se e não sabem. Nascentes diversas, corrimãos separados, brinquedos diferentes. Crescem achando que o mundo é uma reta, mas é bola. E sendo bola tudo se junta: destinos, corrimãos, brinquedos. E foi bem assim. Uma platéia, uma cantante, olhos brilharam, o ímã se fez.

O que se sabe, desde então, é que o mundo [sendo bola] deixou que as coisas se juntassem, fingindo que assim faziam a sós; mas não, até o mundo pede para que - futuramente - se haja mais brinquedos, destinos e corrimãos. Amém.


quinta-feira, 16 de setembro de 2010

CONJUGANDO VOCÊ.

A porta se abriu, se abriu um sorriso, os braços se abriram e o coração.
Os olhos se fecharam, fecharam-se os braços, fechado o passado, o encontro - então.
O medo perdido, perdida a vergonha, perdidamente apaixonada, [das horas] perdi a noção.
Corri da tristeza, correu-se um calor, corri pro teu colo  - achei-me no amor.
Tocados os sinos, toucou-me a alma, tocada de calma, em ti eu toquei.
Senti arrepios, senti um desejo, sentidos e afagos - senti que amei.
Esqueci-me das coisas, esqueci-me em teu corpo, esqueci-me dos rostos antes do teu.
Matei a saudade, matando minha sede, matei-te de beijos, a solidão morreu .
Cantei o teu nome, cantou a aurora, cantado o riso, cantou-se a canção.
A porta fechada, os olhos abertos, os braços tocados, cantado o coração, esquecido o passado. A alma aberta, esquecidos os sinos, perdida em afagos, morta de vergonha, sentido o calor. Corri o teu corpo, perdi minha calma, achei os teus olhos, senti a paixão. Achei o teu colo, matei a tristeza, toquei o teu riso. E agora eu te digo, com todos os verbos, o que eu sinto é eterno e nem pode ser vão.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

SUSPIRAÇÃO.

Há suspiros inconfessáveis. São ventos que levam segredos e desafogam o coração. Há suspiros inaudíveis. São partes de melodias que só tocam a alma de quem sabe. Há suspiros que doem. São pedras que ferem a lembrança de quem ama. Escorregam por lágrimas caladas, entregam o pecador, aquele que sofre de amor, que pena na espera que alimenta a ansiedade. Suspiros sem doce algum.
Uma gota de lembrança suspensa no ar, mandando embora o sossego, deixando vacância no olhar que busca um emprego nalgum lugar - onde está coração? Sei não. Profunda inspiração, três vezes e rápida: lá se vai meu juízo. Expiração certeira: galopa de volta a realidade.
A alma que feita por Deus num momento como o meu, não é de outra coisa senão de suspiros. Sopros são para corações tranqüilos, sem o menor ímpeto. Minha alma foi suspirada e hoje me encontro aqui, viva de interrogações, morta de saudade. Suspiros vêm de almas que são bóias furadas, que deixam escapar o vento da dúvida, que flutuam no oceano do desânimo e do medo. Perdem de si um pouco mais com o vento, mas nada de gastar os tormentos que tentam sair por um fino buraco; é proporcional inversão: quanto mais se suspira, mais se está cheio do que se pôs pra fora.
Vai medo, vai embora! Desgruda de meu pensamento, vai junto com este sopro e leva uma carta pro mundo - este vento de 5 segundos é um vendaval de desejo. Não o quero assim. Prefiro abrir espaço para as brisas em que se transformam os suspiros que de mim fogem quando penso no dono dos meus ais; embalar as velas dos sonhos que partem do cais de saudade a não mais ter este desassossego ébrio. 
Suspiro é o ar que se move em direção marcada e busca com seus braços voláteis apagar o fogo da alma inteira - mas é vão.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

POR VOCÊ

Vi, mas não sabia que por você cantaria em alta voz o hino do Bahia; mas quem adivinharia? Era para ser assim, mas só você sentia. Não quis crer que o óbvio seria o certo, que o inexplicável estaria tão perto. Deve ser assim: luzes fortes cegam, coisas belas emudecem-nos, o simples nos confunde; estas coisas só se sabe com o coração aberto. E o meu enlouquecia...
Côncavo e convexo, opostos que se encaixam e mesmo que um chinês chato nos diga o contrário - fomos feitos um para o outro. Por você eu compro prateleiras, arrumo minhas idéias, meias, livros, sapatos, desculpas. Assereno meus ímpetos, adoço meus instintos, solto meus grilos. É por você que sorrio nas manhãs de chuva e molho fronhas de saudade. Tiro o batom, faço as unhas e depois esqueço tudo isso atrás da porta - I see you e a aparência pouco importa! [Mas por você me arrumo].
Por você eu sinto medo e segurança. Tesouros são presentes, não se deve perdê-los - não mais de uma vez. 
Desde você, faço lista de músicas, de nomes para meninos, acostumo-me com o frio, estudo inglês e acredito que minha casa é o mundo inteiro. Se me jogo, você me segura; se esqueço, você lembra; se espalho, você junta.
Por você e por mim é que tudo se fez assim: eterno.

domingo, 15 de agosto de 2010

CAUSA E EFEITO




Fazer ao outro o que gostaria que ele nos fizesse é uma “trava de segurança” para evitar agir de maneira errada com os outros. Claro, agindo sob o instinto de preservação, ninguém vai fazer mal ao próximo enquanto estiver seguindo esse preceito. Mas há que se pensar no fato de que existem pessoas sem amor próprio e que se causam mal e se agirem de acordo com o já citado preceito, farão mal aos outros. E aí?

Aqui mora um ponto interessante de análise. Se é necessário se querer bem para conseguir fazer bem aos outros, podemos então afirmar que toda vez que fazemos mal a alguém é porque não nos amamos. Amar o outro como a si mesmo não é esforço algum, é uma lei natural, pois amamos com o amor possível a nós outros. Aquele que se arvora em dizer que ama mais ao outro que a si mesmo, está afirmando que não ama ninguém, uma vez que é impossível ofertar o que não se possui nem para si mesmo.

Analisando diversos conceitos ensinados por Jesus, percebemos a lei de causa e efeito em plena ação. Todo o Evangelho é baseado em equanimidade; um outro exemplo disso é a advertência: “não julgueis para não serdes julgados, pois com a mesma medida que julgares assim também tu o serás”. Nela está ínsito que com a mesma medida que julgamos seremos julgados, pois essa é a justiça que compreendemos [já que a utilizamos] e junto com isso há outra afirmação: “a cada um será dado segundo as suas obras”. Como ele não veio destruir a Lei e sim fazê-la cumprir, encontramos o velho conceito de “olho por olho” explicado sob outro viés. Na verdade, confundimos a Justiça com a vingança e aplicamos este conceito de maneira punitiva, na base do “toma lá, dá cá”. Muito embora seja assim que enxerguemos a situação, incorremos no erro de retirar do conceito de justiça o caráter de aprendizado. É com finalidade de aprender que vivenciamos a mesma situação que fizemos o outro vivenciar e isso não é "vingança divina", pelo contrário, é um instrumento didático insuperável. Mas só quem conhece a Plena Justiça é quem deve aplicá-la e é por desconhecermos a Justiça em sua plenitude que,toda vez que nos apressamos em fazê-la com as prórpias mãos,fazemos vingança, pois da Justiça só desejamos a face da "desforra".

Observemos melhor cada uma das afirmações aqui feitas e veremos que só recebemos algo quando já sabemos ofertar e só ofertamos o que já conhecemos em nós. Aquilo que vivenciamos na própria alma [e que por isso já compreendemos] é o que nos será dado. Passemos a uma exemplo menos complexo: uma criança comum não consegue resolver problemas matemáticos que ela só conseguirá resolver se estiver cursando Matemática na Universidade; desta mesma maneira, ela não conseguirá elaborar um problema matemático mais complexo e pedir que outra pessoa qualquer o solucione. Partindo deste princípio, não amaremos o outro de uma maneira maior do que a que nos amamos; nem seremos julgados de uma maneira distinta da que julgamos, tampouco faremos ao outro algo diferente do que já fazemos a nós mesmos.

Alguns podem pensar: mas eu vejo gente cortar outra pessoa e não se cortar; vejo gente enganando os outros e fazendo de tudo para não ser jamais enganado... e aí? Lembram-se da passagem bíblica em que Pedro desembainha a espada e corta a orelha de um dos soldados que vieram prender Jesus? O que diz Jesus a Pedro? “Pedro, embainha a tua espada, pois quem pela espada fere, por ela perecerá”. Se Pedro se amasse conscientemente não faria nenhuma ação contra o outro que pudesse recair sobre si mesmo futuramente. É fácil dizer que se ama a si mesmo, mas estamos aqui para provar isso também.

Toda vez que ousamos fazer mal a alguém estamos afirmando silenciosamente: “eu ainda não sei me amar”.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

POR QUE NÃO PENSEI NISSO ANTES?

Sabe quando uma coisa sempre esteve ali e você não tinha olhos de ver? Às vezes com o amor é assim também. Às vezes é preciso, antes de tudo, lapidar o coração, o olhar, a vontade; preciso educar os desejos e rever as prioridades. Felicidade nem sempre é aquilo que você imaginou que lhe faria feliz, mas exatamente o contrário, ou melhor, o que você nem cogitou te fazer feliz. E quem disse que a felicidade não pode ser uma rasteira que te derruba e te coloca cara a cara com uma boa surpresa?

É preciso, também, permitir-se mudar, voltar atrás, limpar os olhos, e dizer: “eu errei”. Alguns caminhos só são bem feitos se forem assim, desta maneira. De uma maneira que parece bem torta, entretanto, precisava ser assim de um jeito troncho, que parecia errado e que ajudou a fermentar uma outra possibilidade. É preciso ter coragem para retirar o véu dos olhos.

A vida não é um caminho reto, porque não somos seres retos e constantes. Só assim ela seria uma planície infinita. Mas a gente ainda se sente tentado a teimar com as intuições, se sente convidado pelo perfume da facilidade e é por estas e por outras que a determinados truques nos tornamos presas fáceis: só “bobos” caem em armadilhas de “bobos”. Tanta distração nos faz querer a paixão avassaladora e chamá-la de “amor de nossa vida”; nos garante que tal profissão é a garantia daquele carrão e daquela “casona” e que tudo isso é a meta de nossa vida; nos evidencia que aqueles mililitros de silicone nos seios nos fará ser mais amada, enquanto que eles só vão atrair alguns lobos desmamados e nenhuma gota a mais de amor. Aí sim, por crer nestas baboseiras, é que a vida começa a ficar sinuosa, cheia de vales e tediosa.

Preciso é traçar um mapa para o olhar e começar a colocar como bússola da alma certas coisas que não morrem nunca. Coisas simples, reais e que estão logo ali na frente, debaixo do nosso nariz. Ousemos na arte de manter a atenção voltada para a essência e a vida será surpreendentemente simples, verdadeiramente bela!

segunda-feira, 19 de julho de 2010

ADIVINHA...

Você vai ficar sem mim. E eu vou rir porque você nem vai ligar. Eu vou rir porque sei que você não sabe o que está perdendo. Como um bobo sendo filmado sem perceber na praça ou no banco, eu estarei rindo de você. Por detrás do vidro fumê, quem vai me ver? Mas eu vejo, vejo tudo e posso listar o que você não vai ganhar com este seu ímpeto, com este seu jeito insano de me desprezar, de nem ligar pra mim todos os dias. Ah! Já posso até vislumbrar você dizendo: “como assim?” É querido... você não me viu passar e eu passei! Agora estou aqui maquinando e te filmando... você brincando de ser feliz, de guarda baixa, de riso fácil [me engana que eu gosto, porque não vejo graça no que você ri]. Fica aí, viu? Quando o trem da surpresa te pegar... mas eu não vou contar! Quando eu quis cochichar segredos, você se tremendo todo me disse que não estava entendendo nada. Ah foi? Pois então... agora sou eu quem se cala! Agora você nem sabe, fuma um cigarro e anda na cidade. Limpa as lentes e ainda não vê melhor. Acorda todos os dias e vive com sono, pensa que é livre, mas tem dono. Sou eu quem manda em você e amanhã outra vez você vai me perder!
Chamo-me tempo!

sexta-feira, 16 de julho de 2010

ARISTARCO NO MEDIASTINO.

Estou com frio, minha pele se arrepia ao toque do vento, sinto a chuva fina e constante no vidro da janela e tremo: como estará lá fora? Aqui, que tem cobertor, café com leite e pantufas, já é tão frio... lá fora deve estar medonho.

O frio e a chuva sempre me deixam melancólica. Fico pensando em coisas que seriam, pessoas que ficariam, ocasiões de quase alguma coisa; nada é exato num dia frio, nem as horas passam como no relógio. Arrasta-se grudada no ponteiro dos segundos como uma gosma, uma lesma, uma corrente de alma penada. Geme e estertora o ponteiro das horas, enquanto me encolho em meu quarto pensativa.

A cidade debaixo do caos molhado, toda chovida! Toda turbilhonada, aguerrida, apressada da vida e molhada... pingando tristezas pelas esquinas, debaixo dos viadutos tremidos de frio. Afogando as barrigas vazias do mundo que fica de fora de minha janela. Uma cidade sem trinco de porta, de paredes de papelão, sem questão de privacidade, sem segredos debaixo de camas que não tem. São segredos ao lado de sapatos rasgados, molhados e chovidos, também. Se minha hora, quando anda, deixa um finco no chão, a da cidade num dia como hoje, demora anos pra amanhecer e cava um Grand Canyon nas esperanças.

Não falo da cidade que é minha. Falo da cidade dos sofridos! Dos meninos e meninas de rua, de esquina, da vida nada fácil. Falo daqueles que não têm um vão debaixo do que improvisam como cama para guardar sapatos que não acessam. Nestes dias, em que a vida fica tão chovida, eu me lembro melancólica das coisas que seriam certas, das pessoas que ficariam felizes e ocasiões de quase plenitude, se mais gente resolvesse fazer da cidade toda, do mundo e da vida, uma extensão do próprio quarto quente. Se eu estou com frio, lá fora deve estar medonho!


{Poupando buscas no google: Aristarco é uma das crateras da Lua}

quinta-feira, 15 de julho de 2010

BICHO RUIM!

  • Mãe!
  • Huum?
  • Mãaaaae! Minha mãaaaaêeeee!
  • O que é, menina?
  • Tem um bicho no meio do meu peito esticando meu coração!
  • O que?!
  • É mãe... desde ontem eu sinto o bicho grudado aqui, ó!
  • Onde, menina?
  • Aqui mãe! Grudado, ó! Vê aí se tá sangrando...
  • Mas se vê cada uma... tô vendo nada não menina!
  • Afff, tu não sabe ver nada, né? Eu tô sentindo o buraco que o bicho tá fazendo desde ontem, tô sentindo um troço molhado no meu olho, quando eu respiro até incomoda e tu diz que num tem bicho nenhum? Eu quero é prova que não tem um bicho aí!
  • Ô menina... explica isso direito! Tu tá com um buraco no peito?
  • É...
  • O olho derramando alguma coisa quente?
  • É!
  • E quando tu respira incomoda? Sente até meio que doer?
  • É sim, mãe! É isso!
  • Ah... minha filha, é saudade!
  • Eu não disse que tinha um negócio aqui, não disse? buáaa.