Salvador vive momentos de ápice, ondas de violência, tensão
e medo. Creditamos todas estas sensações à greve da PM. Pois bem, depois que
alguns homens, policiais militares, entraram em greve, há um pânico louco por
essa cidade e só se vê tiros para todos os lados. Perdoem-me o trocadilho em
momento inoportuno, tal qual as reportagens dos telejornais da Globo, que nadam
em trocadilhos infames como “os caixões estão pela hora da morte”. Mas é fato
que tiros estão sendo dados a esmo e muitas mortes já foram estatística e
emocionalmente computadas; assim como também é fato que estamos lançando
artilharia pesada sobre todo mundo, na busca de um culpado viável que amalgame
todas as justificativas para esta guerra estar acontecendo. Políticos e
policiais sendo colocados como alvos de nosso descontentamento.
E nós, com nossa ação política coalhada, somos responsáveis
por que? A gente ama a sensação de segurança de nossos bairros chiques, mas
esquecemos que na periferia essa guerra é sempre. A gente odeia greve de PM,
mas esquece que estes trabalhadores se matam e matam todos os dias, recebendo
um salário filho da p... pra enfrentar bandido com armamento muito mais pesado
e sofisticado que o deles. E nessa hora, acreditamos, meus amigos, como
crianças que inventam soluções mirabolantes para problemas graves, que somos
peritos em segurança pública e entendemos de política como ninguém. Isso porque
gritamos aos quatro ventos que esse ou aquele governo é culpado, corrupto e sei
lá mais o que.
Ou é inocência ou é um paliativo para a mente culpada, mas
xingar político por facebook nunca foi e nunca será comoção política! Que tal
fechar sua Veja e sair nas ruas se juntando com outros trabalhadores em busca
de salários mais dignos e condições dignas de trabalho? Que tal parar de xingar
Dilma e se envolver com política a tal ponto que passe a entender que governo é
uma das engrenagens desse todo e que você, meu amigo, não deixa de fazer parte
desta sociedade só porque não votou em determinado governo. Esse pensamento
tacanho é de um fundo egoísta e desarticulado de tal maneira que eu te convido
neste instante a ser mais um responsável pela greve da polícia! Sim. Você está
sendo governado não porque não escolheu esse ou aquele presidente, mas porque
se negou a escolher fazer algo todas as vezes em que foi convidado a fazê-lo.
Por todas as vezes que você embarcou nas historinhas de
direita e acreditou que movimentos sociais são para vagabundos que não gostam
de trabalhar, você contribuiu para a greve da polícia. Todas as vezes que você
pensou que a meritocracia era a melhor maneira de organizar a distribuição da
riqueza de nossa sociedade, você contribuiu para a greve da polícia. Todas as
vezes que você acreditou na democracia racial, você contribuiu para a greve da
polícia. Porque todas as vezes que não conseguimos olhar para os lados e nos
enxergar como iguais, contribuímos para que o parafuso, cansado de ser
parafuso, queira um dia ser melhor. Sabe o que a polícia é chamada a fazer, meu
amigo? Ela é chamada todos os dias para conter os excluídos do nosso sistema de
livre concorrência, onde o mais apto pisa e explora o menos apto. Ela é chamada
para matar os que tem como impedimento de subida uma pedra histórica amarrada
aos calcanhares. Ela é chamada para manter a ordem. E quantas vezes você não
disse essa frase? É ou não é? Manter a ordem. Mas vejam bem... esses policiais,
que são trabalhadores, estão cansados. Para que eles continuem servindo à
sociedade da maneira correta, mantendo tudo no lugar, é preciso que olhemos
para eles como trabalhadores dignos que são.
Porque são eles, meu amigo, que agem na falta da política
que nós todos não ajudamos a mudar. E somos convidados a fazê-lo antes do movimento
urnístico. Somos conclamados pelo movimento do “Desocupa”, pelo movimento
estudantil, pelo movimento dos Sem-Terra, Teto, Porra Nenhuma; movimentos estes
que criminalizamos como estamos fazendo com estes policiais. Movimento de trabalhadores!
Constitucionalmente eles estão em motim. Constitucionalmente
nós todos somos iguais, também. Então, vamos parar de hipocrisia, que esta
veste rota não cobre mais nossas justificativas para continuar apontando o dedo,
a arma, a culpa para D, E ou F [que são as classes que mais sofrem] e nos
isentando da responsabilidade da participação social.
Respeite o trabalhador e se enxergue – se enxergue como tal.
E só vou deixar mais um pensamento entre tantos outros não devidamente
explicados em meu texto provocativo: se a categoria da polícia militar parou e
causou isso, imaginem se os demais trabalhadores parassem...? E parafraseando o
meu conterrâneo, Raul Seixas, eu digo: “essa noite eu tive um sonho de sonhador
maluco que sou, eu sonhei com o dia em que a Terra parou”.
6 comentários:
Genial.
Muito bom o texto Sâmia! A greve dos PM aqui em Salvador está demais. Eles merecerem receber os seus benefícios, mas está colocando a vida de muitas pessoas em risco =/
http://belezapuraonline.blogspot.com/
Muito bom.
Político no sentido verdadeiro da palavra, e mais do que isso, humano, demasiado humano.
Não soube o que pensar além de: Ela é mesmo muito inteligente!
Não que eu tivesse dúvidas, mas isso foi, genial!
Ótimo, minha amiga-irmã, assino embaixo. Abraços...
Excelente reflexão.
Cada um no seu mundinho só pensando naquilo que perdeu. Precisamos chegar a situações limite como essas para percebermos o quanto necessitamos da polícia, pois ninguém "gosta" de polícia.
abçs
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