terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

EX-CREVO


Escrever, para mim, é uma experiência plástica. Na verdade não escrevo - as imagens mergulham nas letras. Eu escrevo o que vivo, como a gotinha d'água na curvinha do umbigo. Eu falo como a água que está em todo canto, que vem de minha vontade firme de estar em todas as coisas. E tem hora que a palavra poca, porque palavra é pouca pra falar de festa e então invento outra que cai como uma louca, traduzindo tudo que me vem na testa.

Escrever exige de mim saliva. Preciso estar com a boca cheia d'água por algo, alguém, qualquer coisa. É uma vontade bruta de me melar de vento, enxergar um presente numa encruzilhada e pensar que os caminhos são braços de fita e que qualquer criança boba os transforma em laço, desfazendo passos que desacreditam.

Não é fácil riscar o branco. É preciso adestramento pra segurar a mula, que coiceia minha mente como uma ama doida, escrevendo as vontades que me vem à boca. Não que meça tudo, eu bem sei que minha maneira é escrever em jatos, não limito as frases pra que caibam na folha, nem convido a régua pra servir de bolha, constrangendo o desalinhos das palavras todas. E mesmo assim, toda essa paixão encontra ao pé da porta um pai severo, que me lembra a todo instante o passar das horas, o entrar sem o namorado, dormir cedo, falar baixo e fininho, fazer as tarefas, porque nem tudo deve ser dito - ai, o dicionário!

As palavras, em mim, precisam deste brigar sem fim, precisam saber que para casar com a folha, dependem mais de uma rolha, que de um arquiteto. Elas não podem se enquadrar, devem sair pelas bordas como água que escapa, mas não querem a torneira como um esfíncter velho, elas querem brincar de pique-esconde, que começa no cantinho que se abafa um berro.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

QUILÔMETRO OU METRO


De pé no portão o que espera lá fora é liberdade. Num convite supremo, ela grita feito louca através dos cadeados, mas eu surda ou cautelosa me escondo atrás das grades. Importa a convicção de que não quero ir, importa dizer mil vezes que o teto me aquece, que a comida é boa e estou bem nessa velocidade - dona liberdade.

"Será?", ela se agita, passando a caneca de alumínio faminta nas barras verticais. Não sei, mas o tremor de minha viva alma não cessa de pensar nas cores de tantos carnavais. Um grito rouco procura lamber meus ouvidos dizendo que há corrida de cavalos lá fora, mas lembro que elas duram segundos - e sossego.

Maldita! Afasta-me de tudo. Contigo desespero e fujo, não acato grades nem malhas de ferro; não sinto sede, fome ou durmo, suor frio ao meio-dia, calor no inverno. Entorpeço frente ao teus brados e me vejo perdida em noites sem rumo, acorrentada na vontade dos teus passos, que me levam sempre no fundo do querer eterno sem matar a sede, sem ceder do cio, na embriaguez do medo de perdê-la por completo, sem nunca ter a provado toda. Depois me deixa no vazio deserto de mim mesma, mostrando o lugar onde poderei encontrá-la, face a face, mas seus olhos me envergonham, pois no fundo a minha alma não está liberta - povoada de Atacama.

Não faz sentido ser sua; me deixa sozinha e ao seu lado sou suja da tinta abjeta dos seus lábios, que falam macio aos meus sentidos e forjam as mentiras dos seus brados, jurando que preciso estar nua para ser completa. Não quero! Afasta de mim suas mentiras imundas, nunca me deu o que pedi na medida, nunca quis trocar, ó liberdade, seus quilômetros vazios por meu Cobertor de um metro.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

SEM ADOÇANTE



Eu tô pensando naquelas "pessoas-adoçantes". Sim, aquelas que são doces, muito doces, estratosfericamente edulcoradas, mas guardam um péssimo sabor residual - lembrando que esta doçura é pura falsidade. Tal qual o adoçante imitando o açúcar, até conseguem enganar e depois, lá no final, na pontinha da língua, olha o travinho lembrando que essa doçura é estranha, estrangeira, forçada, artificial.

Doce é a gentileza que deixa marcas reais, indisfarçáveis em nossa vida. Como a profundidade do gesto de um desconhecido comigo, noutro dia, quando na ocasião da greve da PM em Salvador. Saí do trabalho e para ele não levei mais que uma cópia de meu RG e o cartão de transporte. Sem celular, sem atavios. Nada que os ladrões pudessem arrebatar do pouco que tenho - e que me é caro. Parei no ponto junto com os demais trabalhadores, quando vi um homem de vestes simples e uma mochila surrada nas costas. Negro. A mochila dele estava aberta e deixava à mostra documentos, talvez importantes. Na dúvida, toquei em seu braço, numa intimidade estranha: "moço, sua mochila está aberta". Sim, ele ficou um pouco sem jeito e me agradeceu. A verdade era que o zíper estava quebrado e havia um tempo, ele sabia disso e ficou com vergonha. Mochila também surrada. Meu coração apertou devagarzinho.

Veio o ônibus e nós dois demos a mão para o mesmo Barra-num-seiquê; entramos, ele primeiro e eu depois. Passei na catraca e sentei. Uma mão - a do cobrador - tocou com a mesma intimidade estranha o meu ombro e num sorriso me lembrou que eu tinha esquecido de passar meu cartão antes de atravessar a catraca. E agora? O cobrador com um sorriso dos ricos de alma me disse que logo entraria alguém e essa pessoa trocaria comigo: pagaria em dinheiro a minha passagem e eu poderia passar tardiamente meu cartão. Esperei. Esperei. Fiquei nervosa, pois só tinha R$1,90 numa bolsinha de moedas e o ônibus em Salvador custa absurdos R$2,50. Nada de entrar alguém. Eu em pé ao lado da catraca, pedindo desculpas a um cobrador feliz e o ponto em que eu iria saltar se aproximando célere.

Eu olhava para aquele negro trabalhador, que iria arcar com minha passagem e não acreditava que ele sorria docemente, em seus brancos dentes como pedrinhas do mais genuíno açúcar. Ele não vai brigar comigo? Como ele sabe que eu não estou querendo dar o calote? Sem dúvida ele trazia o coração nos olhos e nos dentes; "menina, calma, vai vir alguém". E depois que sua profética frase soou, eu ouvi alguém perguntar: "o que está acontecendo?". Virei-me e já sem jeito, expliquei à voz toda a situação. Era o moço da mochila aberta, de coração aberto se interessando por meu calote culposo. Ele meteu a mão no bolso e dentre alguns miúdos retirou os R$2,50 da minha passagem e a pagou. Peguei minhas moedas e lhas dei. Meu olho molhou, eu apertei sua mão e disse que estava lhe devendo essa. Ele deu um sorriso-açúcar e disse que não era nada. 

É tudo, meu irmão. Desse tudo que preenche a vida de doçura e custa aquele pouco que se tem no bolso. Ou aquele tudo que não custa dinheiro algum, mas faz diferença na vida de outra pessoa, só porque é de verdade. Só, não... sobretudo porque é verdade. Como o sorriso que recebi de uma velhinha distinta no Campo Grande. Ao findar mais um dia de trabalho, voltando pra casa, a cidade ainda sob o bafo estranho que fica despois do Carnaval, da quarta-feira de cinzas, cheia de bêbados, cheia de escusos perigos saindo dos camarotes semi-desmontados, quando encarei uma senhorinha e ela me deu um doce sorriso que desfez a tonelada de meu peito opresso. Sem adoçante.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

WANDO, WHITNEY E MEU CORAÇÃO.



Esse não é um texto para todo mundo. Não vai falar com qualquer um, tampouco com os melhores, pois não tenho a menor intenção de classificação de quem o lê, de quem o lerá ou vai enjoar no meio dele e clicar no próximo link, assistir outra coisa, mudar de canal. Será um texto de mim, de coisas de mim, das que estão entranhadas em tudo que respiro e nem eu sabia que ainda havia.

Eu sou romântica. Diz o horóscopo que tenho a mistura insana de ter signo de Peixes e ascendente em Áries; o que faz de mim o início e o fim do zodíaco e isso não quer dizer nada para alguma parte das pessoas que aguentarão ler meu texto, mas me define bem para quem me conhece. Sou uma mulher chorosa e impetuosa, romântica e tempestiva. Água e fogo.

Passei grande parte de minha vida suspirando ao invés de respirando. Um passo, um suspiro. Eu sentia tudo a minha volta, amava todos os bichinhos e uma vez tive uma longa crise de choro porque meu pai atropelou um cachorro que atravessou a estrada numa noite destas qualquer. Do ponto em que o cachorro morreu até eu chegar em casa, deitar no travesseiro e dormir, lembro-me que chorei até perder a memória e quando lembrava do cachorrinho rodando no asfalto, eu chorava. Lembro que na escola eu tomava as dores de meus colegas, me metia onde não era chamada e achei que quando crescesse seria advogada – não, pior, serei assistente social. Todos mundo sabia que eu era a manteiga. Nossa! Acabei de me recordar de outra crise de choro que tive na escola quando minha professora de português queridíssima anunciou que no ano seguinte não ensinaria mais a nossa turma. Coloquei as mãos no rosto na hora e chorei, sem nem ter tempo de sair correndo da sala. Meus olhos sempre foram diarreias de lágrimas.

Eu amava Fábio Jr. [Aqui eu tenho CER-TE-ZA que muita gente fechou o texto!]. E minha mãe me contou da minha reação quando ela e painho me deram um LP deste cantor: desmaiei. Eu era uma criança totalmente breguinha! E sou uma adulta semi-brega e só não sou mais porque as pessoas de minha convivência me enchem de críticas a todo instante. Entretanto, a verdade é que eu sou romântica incurável, com todos os clichês e repetições que esta frase merece.

Morreram na mesma semana Wando e Whitney Houston e meu coração chorou um pouquinho. Se fosse antes, eu teria chorado como quando o cachorrinho foi atropelado, pois meu coração nada experimentado chorava indiscriminadamente por animais e cantores românticos-bregas. Depois de algumas decepções, foi o meu Áries que tomou as rédeas de certas atitudes minhas e, desde então, até em homem eu já bati! [Aqui, algumas pessoas vão dizer: barraqueira – com razão, foi um barraco, mas eu não estou nem aí e até hoje rio disso]. Não choro mais como antes, mas não me curei do romantismo raspador de tacho, pisador de jacas, afogador de mágoas. Sinto que há certa cronicidade nessa forma de sentir e se emocionar. Eu tento, minha gente, mas quando vejo já estou sentindo aquele arrepio de revés subindo pela coluna afora, passando pelo cangote e desembocando nos olhos. O cérebro nem se dá conta desse movimento.

Eu choro muito em casamento e no último que fui, uma das convidadas comentou depois com a noiva, que tinha uma moça de verde passando mal num dos bancos da frente [quem era?]. Eu chorei até desrespeitar a maquiagem – limpei os olhos com as costas da mão. Assim que eu soube desse comentário, chorei de rir. E também não mentirei que os símbolos dos laços formados entre os que se amam traduzem esta minha artéria femoral romântica. Qualquer escárnio a respeito disso me faz chorar quietinha, porque hoje em dia é brega sonhar com estas coisas, né? Imagine se importar!

Agora há pouco eu achei de ouvir a música tema do filme “O guarda-costas”. Sim, aquela música desgraçada que diz no meio “nós dois sabemos que eu não sou o que você precisa, e eu vou sempre amar você”. Chorei, mas descobri num insight, que o romance é alguma coisa de super fantasioso, super ideal, super demais e está aí um pedacinho do quebra-cabeça que explica porque diacho eu chorava tanto com coisas românticas: elas não são concretizadas em todos os detalhes na vida real. Não vai haver sempre um homem que tome a zorra de uma bala por sua causa, minha amiga. Mesmo assim, parte de mim jamais se apartará do fato de há alguém assim no mundo, deve haver, tem que haver! Eu me atiraria, gente. E ainda ia ouvir tocando ao fundo “você é luz, é raio, estrela e luar, manhã de sol, meu iá-iá, meu iô-iô + I will always love you”. 

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

NO DIA EM QUE A PM PAROU.


Salvador vive momentos de ápice, ondas de violência, tensão e medo. Creditamos todas estas sensações à greve da PM. Pois bem, depois que alguns homens, policiais militares, entraram em greve, há um pânico louco por essa cidade e só se vê tiros para todos os lados. Perdoem-me o trocadilho em momento inoportuno, tal qual as reportagens dos telejornais da Globo, que nadam em trocadilhos infames como “os caixões estão pela hora da morte”. Mas é fato que tiros estão sendo dados a esmo e muitas mortes já foram estatística e emocionalmente computadas; assim como também é fato que estamos lançando artilharia pesada sobre todo mundo, na busca de um culpado viável que amalgame todas as justificativas para esta guerra estar acontecendo. Políticos e policiais sendo colocados como alvos de nosso descontentamento.
E nós, com nossa ação política coalhada, somos responsáveis por que? A gente ama a sensação de segurança de nossos bairros chiques, mas esquecemos que na periferia essa guerra é sempre. A gente odeia greve de PM, mas esquece que estes trabalhadores se matam e matam todos os dias, recebendo um salário filho da p... pra enfrentar bandido com armamento muito mais pesado e sofisticado que o deles. E nessa hora, acreditamos, meus amigos, como crianças que inventam soluções mirabolantes para problemas graves, que somos peritos em segurança pública e entendemos de política como ninguém. Isso porque gritamos aos quatro ventos que esse ou aquele governo é culpado, corrupto e sei lá mais o que.
Ou é inocência ou é um paliativo para a mente culpada, mas xingar político por facebook nunca foi e nunca será comoção política! Que tal fechar sua Veja e sair nas ruas se juntando com outros trabalhadores em busca de salários mais dignos e condições dignas de trabalho? Que tal parar de xingar Dilma e se envolver com política a tal ponto que passe a entender que governo é uma das engrenagens desse todo e que você, meu amigo, não deixa de fazer parte desta sociedade só porque não votou em determinado governo. Esse pensamento tacanho é de um fundo egoísta e desarticulado de tal maneira que eu te convido neste instante a ser mais um responsável pela greve da polícia! Sim. Você está sendo governado não porque não escolheu esse ou aquele presidente, mas porque se negou a escolher fazer algo todas as vezes em que foi convidado a fazê-lo.
Por todas as vezes que você embarcou nas historinhas de direita e acreditou que movimentos sociais são para vagabundos que não gostam de trabalhar, você contribuiu para a greve da polícia. Todas as vezes que você pensou que a meritocracia era a melhor maneira de organizar a distribuição da riqueza de nossa sociedade, você contribuiu para a greve da polícia. Todas as vezes que você acreditou na democracia racial, você contribuiu para a greve da polícia. Porque todas as vezes que não conseguimos olhar para os lados e nos enxergar como iguais, contribuímos para que o parafuso, cansado de ser parafuso, queira um dia ser melhor. Sabe o que a polícia é chamada a fazer, meu amigo? Ela é chamada todos os dias para conter os excluídos do nosso sistema de livre concorrência, onde o mais apto pisa e explora o menos apto. Ela é chamada para matar os que tem como impedimento de subida uma pedra histórica amarrada aos calcanhares. Ela é chamada para manter a ordem. E quantas vezes você não disse essa frase? É ou não é? Manter a ordem. Mas vejam bem... esses policiais, que são trabalhadores, estão cansados. Para que eles continuem servindo à sociedade da maneira correta, mantendo tudo no lugar, é preciso que olhemos para eles como trabalhadores dignos que são.
Porque são eles, meu amigo, que agem na falta da política que nós todos não ajudamos a mudar. E somos convidados a fazê-lo antes do movimento urnístico. Somos conclamados pelo movimento do “Desocupa”, pelo movimento estudantil, pelo movimento dos Sem-Terra, Teto, Porra Nenhuma; movimentos estes que criminalizamos como estamos fazendo com estes policiais. Movimento de trabalhadores!
Constitucionalmente eles estão em motim. Constitucionalmente nós todos somos iguais, também. Então, vamos parar de hipocrisia, que esta veste rota não cobre mais nossas justificativas para continuar apontando o dedo, a arma, a culpa para D, E ou F [que são as classes que mais sofrem] e nos isentando da responsabilidade da participação social.
Respeite o trabalhador e se enxergue – se enxergue como tal. E só vou deixar mais um pensamento entre tantos outros não devidamente explicados em meu texto provocativo: se a categoria da polícia militar parou e causou isso, imaginem se os demais trabalhadores parassem...? E parafraseando o meu conterrâneo, Raul Seixas, eu digo: “essa noite eu tive um sonho de sonhador maluco que sou, eu sonhei com o dia em que a Terra parou”.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

JULIANA NÃO QUER AMAR? AMA, JULIANA, AMA!



Eu estava esperando Juliana amar pra eu voltar a falar bem do mundo. Tava querendo ver até onde iríamos aguentar: Juliana sem amar e eu sem falar bem da vida. Não suportamos por muito tempo. E eu não sabia, dona Juliana, que amavas tão bonito assim! Tão bonito que me faz conjugar o verbo todo enfiado na segunda pessoa do singular.

Não que Juliana tenha inventado um jeito outro mais bonito de amar, mesmo porque Juliana é igual a um bando de menina bonita que se vê por aí. Daquelas bonitas que são mais bonitas porque não tem certeza de nada – nem da beleza de si, nem do amor. Juliana, ah Juliana...! Amando, hein? Só você não sabia que podia ir fazendo isso tão bem. Fica a dica: nem sempre amiga mente pra te ver sorrir!

Ontem eu pensei que estava sem tripas e hoje vejo você assim, não tem como não rir, como não bendizer este mundo que faz Julianas encontrarem garotos que lhe possam – e saibam – amar. E eu estou feliz porque posso voltar a dar uma banana p’aqueles que vivem afiando os cascos nas navalhas de pessimismo – vejam, seus otários, Juliana ama!

Tão florida, minha menina... fazendo tudo que todo mundo faz, mas que é inédito todos os dias. Amor é gostoso como pão com ovo e café com leite. É bom ver você com fome – se acaba, viu Juliana! Mata tudo que estava te matando. E sua fome é tão justa e tão santa que me faz lembrar do amor que tenho, que sinto, que envergo como um vestido de verão.

Verei seus sorrisos mais sorridos e sua voz mais dengosa, suas mãos pequenas mais trêmulas e todos os românticos com mais razão. Verei o mundo com mais sabor, como se fora um bubbaloo de morango ou muitos deles numa boca só. Porque quando a gente é criança e quando dão vacilo, enfiamos uns três chicletes na boca de uma vez . E amor é assim guloso, né? Doce, gostoso, infantil e faminto.  E é muito feliz ver uma Juliana amando assim, pois quem não tem uma Juliana sorrindo por amor, precisa ter pra relembrar da vida fazendo ploc ploc entre os lábios e mostrando bem todos os dentes!

COMO É QUE ESCREVE?


Alguma coisa roubou minhas palavras das tripas. Não escrevo mais como antes. Não tenho mais aquela gana de ir vendo o papel desembranquecer. Tenho tido uma raiva dos gênios que escrevem coisas putaquepariulizadas e só faço ler facebook e outras modernidades.

Tenho medo de estar sem assunto, sem tesão e não vejo em canto nenhum algo que hasteie o mastro do meu vocabulário. Vai ver é porque eu tinha tempo de ver rosa no mundo e ver a vida não me pedir comprovante de residência. Eu tinha tempo de ir, em minhas tardes, na beira da praia e sentir o vento assanhar minha saia. Eu não beijava ninguém, eu comia papel xerocado.

Vai ver eu me achava uma pirralha ao entrar na faculdade e agora, ao final, sobreveio-me uns 200 anos no couro, algumas decepções e a certeza que meu QI saltou pra zero. Ou pode ser também a sensação de que fui sugada pela realidade e antevejo o riso dos desconfiados que diziam: “gente é a desgraça da gente”. Eu tenho medo de sorrir e ser presa por desacato à autoridade-desconfiança deste mundo cão. A regra é clara: plante seu olho nas costas!

Eu me afoguei numa poça de concretude e agora confesso que fui eu que estripei as linhas dos meus textos. Matei minhas rimas e joguei soda cáustica na linguagem. Estou caducando meu jeito de ser aos poucos, deixando na masmorra de sonhos minha alma criança e desse jeito é que não consigo escrever bonito. Toda vez que tento escrever, eu sinto minhas unhas grafando no asfalto das horas. Eu não tenho mais tempo de fazer as coisas fazerem sentido. Abro o olho, almoço, trabalho e janto. O alimento que engulo só me deixa faminta, o anseio de mudar me devora e eu penso por instinto, sacolejando entre os gados do coletivo lotado.

Talvez por isso eu não escreva mais como quem sonha, não sonho mais como quem pode, não posso mais como quem voa, não voo mais como quem escreve.