segunda-feira, 29 de outubro de 2012

CALÇAS DE FERRO


Não posso negar que às vezes perco a fé no ser humano. Perco-me entre as ações de falsidade, de maldade, de desrespeito, de covardia, de mentira... Vejo gente egoísta pipocando em todos os cantos e me questiono se mudaram o significado da expressão “consciência tranquila”. Pode ser que seja uma nova modalidade da Anestesiologia e eu não saiba. Pode ser um novo significado antropológico para total ausência de alteridade, empatia ou algo que valha. Talvez seja o “foda-se” ligado com o botão do aparelho emperrado. Deve ser por este motivo que se vê em abundância tantas pessoas agindo com total má fé e dormindo tranquilamente à noite.

Não há mais pessoas com capacidade de sacrificar os próprios fundilhos e até concordo que seja lícito cada um tirar o seu da reta, afinal de contas, em tempos de farinha escassa, convém cada um correr para fazer seu pirão o quanto antes. Mas e quando se sabe que sua farinha não será roubada e mesmo assim faz-se questão de dispor de toda a farinha do saco por pura desimportância que se dá ao outro? É sim... é... eu sou uma boba por questionar estas coisas, não é? É sim... eu sou! E serei nos infinitos passos que me restam nessa vida.

Já ouvi de algumas pessoas que eu fiz um pacto com a otaridade – que é a capacidade contumaz de ser otária e ainda assim esperar o melhor dos outros. Mas não é bem assim. Eu, simplesmente, não espero nada. As pessoas não nos prometem amizade por nossa causa, não unicamente. Elas usufruem de algo da gente; há algo em nós que lhes faz bem e muitas são leais a esse bem que causamos a elas. Não lhes seja problema, porém. Claro que o mundo inteiro não se dissolve neste conceito, mas é rara a qualidade de doação além da troca.

Temos, inclusive, a escolha de não mais confiar em nenhum ser vivente. Todos são capazes de nos desapontar. Todos. Entretanto, esta escolha feita com amargura, certamente, nos fará infelizes. Não precisamos confiar no sentido de criar expectativas e depositar esperanças todas nas mãos de alguém. É muito peso na mão de um ser falho, não acham? Fazer isso é um modo de sobreviver, que creio seja válido contra a doença da anestesia coletiva de consciência. Seria bom não precisar disso. Mas chega de quimeras, pois enquanto no mundo houver maioria de consciência tranquilamente anestesiada é muito provável que cada um precise usar calças de ferro.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

CHEGASTE


Se eu soubesse que viria, de flores me vestiria dos pés à cabeça
Se de tua vinda me avisasse, talvez já me encontrasse com as luzes acesas
Acenderia muitas velas e cobrir-me-ia de cores
Não desperdiçaria os amores colocados em outras mesas
Se soubesse que teus risos me seriam o lembrete de felicidade tanta
De deitar-me em teus mantos
Não maldiria os prantos derramados em segredo
Esbagaçaria os medos em diversos estilhaços se o longe som dos teus passos
Não me levasse ao degredo de esperar por teus abraços por tanto tempo
Por que – vida minha – não me mandou uma missiva contando de tua chegada?
Poderia eu lavar-me da lavanda dos meus sonhos de menina embonecada
Sentar-me na varanda, balançar-me ansiosa à espera do calor destes teus beijos
E hoje que te vejo ao pé da porta, namorando-me desta maneira
Como faço com a surpresa de ver-te todo em meus suspiros
Onde ponho o nervoso riso de encontrar-me com tua boca - 
E que me tenhas como louca: esperei-te a vida inteira!

domingo, 12 de agosto de 2012

FILOSOFIA JOSÉ AUGUSTO


Cortei o cabelo essa semana. Passei semanas desejando isso, pesquisei, vi milhares de fotos, mil cortes diferentes, mas todos voltados para o que eu realmente queria fazer: cortar curto. Eu pegava a minha franja na frente do espelho e colocava de um jeito pra saber se ficaria legal. O resultado era sempre bom e eu já estava decidida que seria isso mesmo.
Geralmente, quando eu me decido por uma coisa - apesar da demora para isso – não volto mais atrás e no caso do cabelo é mesmo impossível voltar atrás depois da coisa estar feita. E da maneira que escolhi não teria outro jeito a não ser esperar crescer, rezar, fazer penitência e tal. Eu me apaixonei pelo corte curto e há muito anelava o sonho de fazer leveza na cabeça deixando para trás alguns gramas de pelo cheio de química.
Um namoro longo, repleto de olhares atenciosos, de detalhes minuciosos e eu prestei bastante atenção para não haver arrependimentos. Fui lá e fiz! Escolhi uma cabeleireira infértil que cobrou meus dois ovários e o útero pelo corte e me dei toda a sua tesoura. Ela veio rápida e sedenta, quase sem me dar chances para desistir. Pegou meus poucos fios e os desfez.
Saí do salão com aquela sensação de que tinha todo um bairro me olhando. De cabelos molhados fiz passos mais apressados, doida pra chegar em casa e dar meu jeito no cabelo. Louca pra escová-los e ajeitá-los ao meu modo. Já no meio do caminho eu comecei a entender Robert Pattinson perfeitamente. Nasceu em mim uma solidariedade sem tamanho a ponto de me irritar ao ver qualquer piadinha a respeito da traição sofrida por este ator.
Não falem de Robert! Só eu e ele sabemos o que é ser traído depois de um namoro longo: eu não queria ver nenhum vizinho. Entrei em casa com a sensação de estar me ocultando dos holofotes e flashs das câmeras perversas de Hollywood. Rezei nos últimos segundos antes de conseguir me arremessar pelo portão de casa à dentro, pedindo a Deus que sumissem todos os meus conhecidos e que nenhum olhar menos discreto pudesse fazer considerações sobre meu novo look. Deus me ouviu.
Consegui escová-los e só na base do chicote o leão que havia em mim [agora representado em forma de juba] foi domado. Eu tremia igual a vara verde, suava só imaginando como fazer para ir para o trabalho com aquela cara. Mas o pior ainda estava por vir. Meu noivo me mandava mensagens a todo momento dizendo que estava louco para me ver de cabelo cortado. Eu tive cólicas a tarde inteira imaginando esse encontro. Como dizer a ele que aquela mulher-leoa era mesmo sua noiva querida? Como dizer que não foram ladrões de cabelo que me roubaram a aparência e sim que eu paguei por aquilo ali? Foi a tarde mais longa de minha vida. Meus colegas de trabalho, gentis como sempre, me fizeram muitos elogios, mas isso só me acalmou a ponto de conseguir desempenhar minhas tarefas. Eu teria que sair dali às 19h e meu noivo viria me pegar no trabalho.
Quando deu 19 horas eu saí, peguei o elevador e desejei que ele tivesse freios para retardar o instante do encontro. Pensei por dois segundos em agarrar nos cabos de aço igual a um gato e não descer nunca mais – ou até que eu voltasse a parecer gente. E ele estava no saguão, sentado numa poltrona e olhando o celular; pensei “deve estar ligando pro SAMU”. Levantou a cabeça e quando me viu, sorriu dizendo: “amor, você está linda!”. A partir deste momento eu resolvi ser adepta da filosofia José Augusto: “mente pra mim, me ajuda a viver!”.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

STATUS: DISPONÍVEL.


Sempre me questionei sobre algumas ações minhas. Na verdade, a questão é como executo determinados papéis que possuo – por encargo ou escolha – nesta vida. Eu erro, tu erras, ele erra e erramos todos. Mas como é complicado lidar com o erro! Quase sempre nos fazemos aquela pergunta quando dá uma merda qualquer: “onde foi que eu errei?”. Daí, ao descobrirmos onde erramos, partimos algumas vezes para a punição.
Na atitude de auto-punição nós não modificamos nada ao nosso redor, tampouco em nosso interior. Onde está a reabilitação? Será que o culpado se permite reabilitar? Será que o culpado se permite rever os próprios passos na intenção de fazer diferente do momento da constatação do erro em diante? Eu creio que não. Mas o responsável sim. O responsável revê seu caminho, identifica o erro e se propõe a modificar o que desacertou. Aqui entra o ponto “vítima” da minha reflexão de agora: a disponibilidade.
Não... não estou falando do status do bate-papo. Estou falando de disposição íntima para realizar determinada coisa. Disposição é tudo! Estar disponível é permitir que as ferramentas pessoais entrem em ação. Estar disponível é permitir que a constatação do erro sirva para modificação da realidade, pois podemos ser virtuosos, trazer características positivas, ter bom coração, mas sem boa vontade, ou seja, disponibilidade ao acerto, não teremos direcionamento consciente de nossas ações.
Acostumamo-nos a pensar que a vida é o arranjo que parte sempre em direção ao equilíbrio. Correto. Entretanto, a nossa inteligência deve ser testada e ampliada para compreender que podemos interferir no processo de reequilíbrio estabelecendo o domínio das nossas atitudes – sobretudo o domínio emocional. Eu falo de reequilíbrio, porque faz parte do processo de aprendizado o “arrumar-desarrumar-arrumar”. Erramos todos porque é fato que agiremos pela ignorância e o desconhecimento nos faz desbravar novas terras, que uma vez desbravadas, agregam em nós o conhecimento, que por sua vez nos faz firmar atitudes novas e que nos impulsiona para o desconhecido e assim sucessivamente. Não errar é não viver. Errar não é problema, problema maior é quando não nos disponibilizamos ao acerto.
O automatismo rege a ignorância; no momento que nos tornamos conhecedores a única coisa que nos impede de acertar é a disposição íntima para a real modificação interna e externa. A vida vai se equilibrar depois do desacerto? Sim, mas não é melhor que participemos disso para que ela não faça isso cegamente? Vamos a um exemplo concreto? Transporte de substâncias através da membrana de uma célula animal. Naturalmente elas podem ser transportadas obedecendo o gradiente de concentração e, portanto, sem gasto de energia. Mas há o caso do transporte ativo, que é feito contra o gradiente de concentração e com gasto de energia. Estar disposto é isso: é gastar energia, movimentar a inteligência, emocional também, para gerenciar a direção da própria vida.
E estar disposto não é bradar com todo pulmão “eis-me aqui”, é dizer que está disponível para agir e não somente sofrer a ação automática da vida, que promove o equilíbrio novamente. Refletir acerca do ponto onde errou, esforçar-se para perceber como deveria ter agido, identificar as possibilidades de conserto e dizer “estou disposto a fazer tudo para ser melhor”.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

RÁPIDO

O amor, meus caros, despenteia! Amassa roupas, suja os dentes, arranca os brincos, quebra os saltos, tira o batom. O amor vendavalva todas as coisas vãs. Depois do amor só resta o certo, o básico, o mínimo necessário, um cômodo com uma porta e uma janela e um buraquinho pra respirar. Tudo o mais vem abaixo. Toda lei - por mais física - fica esquecida, a gravidade é abolida, a distância é relativa, o tempo cuida de correr louco. Einstein começa a falar de amor e a saudade é uma constante inversamente proporcional à vontade de estar dentro – porque perto é pouco.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

AOS SEUS OLHOS


E há o mar.  Há aquele rugir das ondas, mordendo as areias da praia. E há o mar ronronando ao pôr do sol, negando quem é – ou vestindo-se de outros sais. Enroscado nos novelos d’água, há mares de pó, sedimentados na Terra Coração. E quem dirá que é água ou terra a natureza do mar? Fundo e superfície são faces de um mesmo ser.

Não pode ser que haja lógica em querer permanecer em calmaria, quando o dia anuvia-se de negro, quando o vento uivando nos ouvidos, faz dos cabelos navalhas nos olhos e o céu chora de tristeza, perfurado de trovões. Aí o mar explode, aí a água entra em guerra e cospe para longe os mais bravos guerreiros ou os incautos marinheiros que ousam lhe tocar as costas. E todos temem o mar, e todos julgam o mar, e todos buscam as bancadas de areia, fugindo da liquidez assassina. E o mar ergue seus braços mais alto e abraça o céu...

Quando passa, o vento lambe o mar, a onda faz amor com a areia, o mar, engravidado de sereias, volta ao seu lugar. A paz canta nas pequenas conchas, o céu enxuga as lágrimas nas coxas das nuvens e ele, todo dengoso, mia em ondas baixinhas. E correm seus admiradores para seus braços! E vinga a poesia, a melodia, as mais lindas canções. O mar é um amigo, cobertor dos amantes, que inconvenientes se abraçam de corpo todo sob suas águas e se embalam junto com suas ondas. “Ai, mar, eu te amo! Sua existência me inspira!”, dizem os elegantes. O mar responde, pensando incompreendido, “jamais quis ser paisagem num postal”. Porque sabe o mar que para ser inteiro é preciso ser todo e talvez o tolo não consiga compreender, que só mergulhado, aberto e constante é que se avança em sua natureza.

Por isso que na hora da tormenta, no momento da solidão, quando  bravo se encontra, o mar corre pro céu, pois só ele lhe vê inteiro e sabe de seus segredos, sem jamais ocupar o seu lugar. Não foje do mar, o céu. Não condena sua revolta. E espera, sem nenhuma porta, que tudo se transforme. Depois... depois os dois se casam em azul, num dia luminoso e só eles é que sabem porque dividem a mesma cor.

{aos olhos de mar que miram minha alma}

terça-feira, 27 de março de 2012

[SÓ] VASO


Não desejo que meu coração se reagregue, porque estou ferida e sei que isso é meu. Não há culpados, nem desordeiros que avançaram sobre as tendas empoeiradas e derrubaram tudo; eles vivem como sabem - eu expus o que tenho. Fui eu, na vã escolha do passado, que optei por morar no deserto. Exilei-me dos ventos do litoral, exilei-me da segurança dos barcos ancorados e fui ter com mar bravio. Depois dele, só deserto. Nada de mar e rio, a não ser o peito - correndo em leito salgado.

Os vasos caídos, os cacos nascidos e mais uma vez a cola retorna às minhas mãos tentando reaver com arte a parte que sobra do meu coração. E parece que ele sempre sobra. Por isso desisto de colá-lo e irei deixá-lo nos pés do deserto, bebendo da areia que chove dos montes movediços e cantantes que vejo de perto. Tudo que crio aqui se esvai e esta parte que o deserto me subtrai não faz falta nas futuras canções.

Melhor outro dia ter um novo vaso e este quebra agonizante, abraçado à dor uivante de ter morado no castelo pisado por bandoleiros. O que levo aqui comigo é outra coisa, outro abrigo que oferto ao mais corajoso, destemido beduíno. Não é nenhuma riqueza, nada que os salteadores tenham me levado. Não reluz como ouro, não compra comida e casa e não pode ser vendido, vilipendiado ou ferido. É o conteúdo dos vasos quebrados: água de esperança. E o coração que permaneça partido e que o tempo o corroa, transforme-o em areia; que o vento o leve e ele volte aos pés do mar em que estava antes de morar nas areias de tão ingrato deserto.

sexta-feira, 23 de março de 2012

CONTA DA LUZ


Uma das grandes maravilhas que possuo é minha família. Todas as vezes que eu precisei de apoio, ainda que eles não concordassem comigo, estiveram ao meu lado. Os meus pais não são perfeitos, mas ainda que estejamos nadando em divergência, eles me acolhem. Não desrespeitam meu sofrimento, não ultrapassam o limite do sinal vermelho e sabem reconhecer uma bandeira branca suspensa. Os meus irmãos são parceiros de muitas horas. Eles são caladões, não sabem florear palavras e frases de efeito, mas guardam um abraço dado de maneira torta, ou um aperto de mão dizendo do apoio. A minha filha, essa ficou por último porque tem sabor único. Ela me disse, num dia de tristeza, uma frase assim: “mamãe, pessoas vão e pessoas vem, mas eu sempre estarei contigo”. E é verdade. Ainda que ela sinta um ciúme muito grande, ela me partilha com quem chega, ela sabe calar a própria vontade de me reter – talvez porque tenha percebido que mãe dela eu jamais deixarei de ser.

Os outros grandes tesouros que possuo são meus amigos. Estes são muito presente. E porque são meus amigos, me abraçam, me confortam, me buscam, me atingem no coração. Eles me mantêm de pé porque não me deixam esquecer que laço não precisa de pedigree. Precisa de afeto e lealdade. Porque sem estas duas coisas qualquer coisa pode acontecer, menos amor. E amizade é amor primário, primaz. 

A esperança que guardo em meu peito vem do fato de que, embora minha estrada seja só minha, eu não estou sozinha. Não estou esquecida destes corações. E na ocasião do meu 31º aniversário, recebi a enxurrada de certezas de que vale a pena continuar sempre amando. 

E agora, enquanto escrevo este texto, eu lembrei que um ex-namorado me falou uma vez, em seu jeito bronco de ser, que “a gente paga a conta da Coelba todos os meses em dia, mas se a gente não paga um mês, eles cortam a luz”. É assim mesmo: luz a gente tem que se esforçar para ter e de graça mesmo só a do sol, que mesmo assim, foge depois das 18 horas. E nenhum dos meus amores fugiu depois das 18horas, isso deve ser porque ando pagando a conta de luz.

quarta-feira, 14 de março de 2012

ESTA ALMA

Minha alma está vazia. Não, ela não está morta, nem triste, nem alegre. Está em silêncio. Certeza de estar tudo certo. Vão do que virá, porém. Nenhuma dor - foi toda chorada. Nenhuma espera. No aguardo de nada. Nem milagres, nem quimera. Não caminha sem rumo, ao léu - vai certa. Presa na terra, com os olhos pro céu. Não me procure mais lá - onde não estarei. Não me espere lá - onde vou chegar. Apenas sei que minh'alma está a se encher - do que serei.

quinta-feira, 8 de março de 2012

DIAS PARA QUEM SE SENTE MULHER



Não existe doçura nata. O jeito especial de amolecer a vida com um gesto brando, vem do esforço de se tornar dócil, paciente, aconchegante, acolhedor. Tudo é exercício, firmeza e foco. Claro que há algumas pessoas que trazem essa marca estampada na testa, fazem da doçura o seu cartão de visitas e atraem para si um monte de formiguinhas famintas.

O mesmo se dá com a maternidade. Nem todos são maternais. Maternar é um exercício que até as mães precisam se esforçar para praticar. Exige abnegação, doação do tempo, do colo, do coração. Exige altruísmo sem esquecimento de si mesmo. Por isso que tem muita gente que não abraçou para a própria vida a escolha de maternar, uma vez que ainda não se sente apto para sair de si mesmo, decidir amar alguém, detendo-se um pouco no caminho pelos filhos do coração.

Engana-se quem encerra a doçura e a maternidade à condição de ser mulher. Digamos que o ser mulher nasceu com instrumentos físicos que auxiliem no desenvolvimento destas [que considero] virtudes. Mas todos possuem coração e é neste local que cultivamos a doçura e acolhemos filhos - que podem ser amigos, desconhecidos, pessoas que nascem da gente, nossos pais, o inimigo.

Não coloquemos no terreno do automatismo estas duas condições da alma que ama, porque estaremos sendo injustos com quem lutou para se tornar assim. Não existe nada que esteja construído que não tenha começado pela vontade de alguém. Não existe nenhuma característica existente em nós que não seja alimentada diariamente pelo nosso esforço de que ela continue viva. E esta regra rege as coisas boas e ruins.

Portanto, hoje, no dia internacional da mulher [aquela a quem se convencionou associar estas duas virtudes], eu parabenizo a todos que possuem a alma no ponto certo de doçura e o coração na temperatura certa do amor. Não estou tirando o significado histórico da data, não estou diluindo a luta da mulher nestas palavras; apenas aproveito o dia para mexermos em nossas distrações, que atrelam toda essa maneira de amar a condicionantes de gênero, porque ser mãe não é possuir útero.

E para aqueles que acreditam em Deus: já pensou que Ele pode, muito bem, ser Pãe?

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

EX-CREVO


Escrever, para mim, é uma experiência plástica. Na verdade não escrevo - as imagens mergulham nas letras. Eu escrevo o que vivo, como a gotinha d'água na curvinha do umbigo. Eu falo como a água que está em todo canto, que vem de minha vontade firme de estar em todas as coisas. E tem hora que a palavra poca, porque palavra é pouca pra falar de festa e então invento outra que cai como uma louca, traduzindo tudo que me vem na testa.

Escrever exige de mim saliva. Preciso estar com a boca cheia d'água por algo, alguém, qualquer coisa. É uma vontade bruta de me melar de vento, enxergar um presente numa encruzilhada e pensar que os caminhos são braços de fita e que qualquer criança boba os transforma em laço, desfazendo passos que desacreditam.

Não é fácil riscar o branco. É preciso adestramento pra segurar a mula, que coiceia minha mente como uma ama doida, escrevendo as vontades que me vem à boca. Não que meça tudo, eu bem sei que minha maneira é escrever em jatos, não limito as frases pra que caibam na folha, nem convido a régua pra servir de bolha, constrangendo o desalinhos das palavras todas. E mesmo assim, toda essa paixão encontra ao pé da porta um pai severo, que me lembra a todo instante o passar das horas, o entrar sem o namorado, dormir cedo, falar baixo e fininho, fazer as tarefas, porque nem tudo deve ser dito - ai, o dicionário!

As palavras, em mim, precisam deste brigar sem fim, precisam saber que para casar com a folha, dependem mais de uma rolha, que de um arquiteto. Elas não podem se enquadrar, devem sair pelas bordas como água que escapa, mas não querem a torneira como um esfíncter velho, elas querem brincar de pique-esconde, que começa no cantinho que se abafa um berro.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

QUILÔMETRO OU METRO


De pé no portão o que espera lá fora é liberdade. Num convite supremo, ela grita feito louca através dos cadeados, mas eu surda ou cautelosa me escondo atrás das grades. Importa a convicção de que não quero ir, importa dizer mil vezes que o teto me aquece, que a comida é boa e estou bem nessa velocidade - dona liberdade.

"Será?", ela se agita, passando a caneca de alumínio faminta nas barras verticais. Não sei, mas o tremor de minha viva alma não cessa de pensar nas cores de tantos carnavais. Um grito rouco procura lamber meus ouvidos dizendo que há corrida de cavalos lá fora, mas lembro que elas duram segundos - e sossego.

Maldita! Afasta-me de tudo. Contigo desespero e fujo, não acato grades nem malhas de ferro; não sinto sede, fome ou durmo, suor frio ao meio-dia, calor no inverno. Entorpeço frente ao teus brados e me vejo perdida em noites sem rumo, acorrentada na vontade dos teus passos, que me levam sempre no fundo do querer eterno sem matar a sede, sem ceder do cio, na embriaguez do medo de perdê-la por completo, sem nunca ter a provado toda. Depois me deixa no vazio deserto de mim mesma, mostrando o lugar onde poderei encontrá-la, face a face, mas seus olhos me envergonham, pois no fundo a minha alma não está liberta - povoada de Atacama.

Não faz sentido ser sua; me deixa sozinha e ao seu lado sou suja da tinta abjeta dos seus lábios, que falam macio aos meus sentidos e forjam as mentiras dos seus brados, jurando que preciso estar nua para ser completa. Não quero! Afasta de mim suas mentiras imundas, nunca me deu o que pedi na medida, nunca quis trocar, ó liberdade, seus quilômetros vazios por meu Cobertor de um metro.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

SEM ADOÇANTE



Eu tô pensando naquelas "pessoas-adoçantes". Sim, aquelas que são doces, muito doces, estratosfericamente edulcoradas, mas guardam um péssimo sabor residual - lembrando que esta doçura é pura falsidade. Tal qual o adoçante imitando o açúcar, até conseguem enganar e depois, lá no final, na pontinha da língua, olha o travinho lembrando que essa doçura é estranha, estrangeira, forçada, artificial.

Doce é a gentileza que deixa marcas reais, indisfarçáveis em nossa vida. Como a profundidade do gesto de um desconhecido comigo, noutro dia, quando na ocasião da greve da PM em Salvador. Saí do trabalho e para ele não levei mais que uma cópia de meu RG e o cartão de transporte. Sem celular, sem atavios. Nada que os ladrões pudessem arrebatar do pouco que tenho - e que me é caro. Parei no ponto junto com os demais trabalhadores, quando vi um homem de vestes simples e uma mochila surrada nas costas. Negro. A mochila dele estava aberta e deixava à mostra documentos, talvez importantes. Na dúvida, toquei em seu braço, numa intimidade estranha: "moço, sua mochila está aberta". Sim, ele ficou um pouco sem jeito e me agradeceu. A verdade era que o zíper estava quebrado e havia um tempo, ele sabia disso e ficou com vergonha. Mochila também surrada. Meu coração apertou devagarzinho.

Veio o ônibus e nós dois demos a mão para o mesmo Barra-num-seiquê; entramos, ele primeiro e eu depois. Passei na catraca e sentei. Uma mão - a do cobrador - tocou com a mesma intimidade estranha o meu ombro e num sorriso me lembrou que eu tinha esquecido de passar meu cartão antes de atravessar a catraca. E agora? O cobrador com um sorriso dos ricos de alma me disse que logo entraria alguém e essa pessoa trocaria comigo: pagaria em dinheiro a minha passagem e eu poderia passar tardiamente meu cartão. Esperei. Esperei. Fiquei nervosa, pois só tinha R$1,90 numa bolsinha de moedas e o ônibus em Salvador custa absurdos R$2,50. Nada de entrar alguém. Eu em pé ao lado da catraca, pedindo desculpas a um cobrador feliz e o ponto em que eu iria saltar se aproximando célere.

Eu olhava para aquele negro trabalhador, que iria arcar com minha passagem e não acreditava que ele sorria docemente, em seus brancos dentes como pedrinhas do mais genuíno açúcar. Ele não vai brigar comigo? Como ele sabe que eu não estou querendo dar o calote? Sem dúvida ele trazia o coração nos olhos e nos dentes; "menina, calma, vai vir alguém". E depois que sua profética frase soou, eu ouvi alguém perguntar: "o que está acontecendo?". Virei-me e já sem jeito, expliquei à voz toda a situação. Era o moço da mochila aberta, de coração aberto se interessando por meu calote culposo. Ele meteu a mão no bolso e dentre alguns miúdos retirou os R$2,50 da minha passagem e a pagou. Peguei minhas moedas e lhas dei. Meu olho molhou, eu apertei sua mão e disse que estava lhe devendo essa. Ele deu um sorriso-açúcar e disse que não era nada. 

É tudo, meu irmão. Desse tudo que preenche a vida de doçura e custa aquele pouco que se tem no bolso. Ou aquele tudo que não custa dinheiro algum, mas faz diferença na vida de outra pessoa, só porque é de verdade. Só, não... sobretudo porque é verdade. Como o sorriso que recebi de uma velhinha distinta no Campo Grande. Ao findar mais um dia de trabalho, voltando pra casa, a cidade ainda sob o bafo estranho que fica despois do Carnaval, da quarta-feira de cinzas, cheia de bêbados, cheia de escusos perigos saindo dos camarotes semi-desmontados, quando encarei uma senhorinha e ela me deu um doce sorriso que desfez a tonelada de meu peito opresso. Sem adoçante.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

WANDO, WHITNEY E MEU CORAÇÃO.



Esse não é um texto para todo mundo. Não vai falar com qualquer um, tampouco com os melhores, pois não tenho a menor intenção de classificação de quem o lê, de quem o lerá ou vai enjoar no meio dele e clicar no próximo link, assistir outra coisa, mudar de canal. Será um texto de mim, de coisas de mim, das que estão entranhadas em tudo que respiro e nem eu sabia que ainda havia.

Eu sou romântica. Diz o horóscopo que tenho a mistura insana de ter signo de Peixes e ascendente em Áries; o que faz de mim o início e o fim do zodíaco e isso não quer dizer nada para alguma parte das pessoas que aguentarão ler meu texto, mas me define bem para quem me conhece. Sou uma mulher chorosa e impetuosa, romântica e tempestiva. Água e fogo.

Passei grande parte de minha vida suspirando ao invés de respirando. Um passo, um suspiro. Eu sentia tudo a minha volta, amava todos os bichinhos e uma vez tive uma longa crise de choro porque meu pai atropelou um cachorro que atravessou a estrada numa noite destas qualquer. Do ponto em que o cachorro morreu até eu chegar em casa, deitar no travesseiro e dormir, lembro-me que chorei até perder a memória e quando lembrava do cachorrinho rodando no asfalto, eu chorava. Lembro que na escola eu tomava as dores de meus colegas, me metia onde não era chamada e achei que quando crescesse seria advogada – não, pior, serei assistente social. Todos mundo sabia que eu era a manteiga. Nossa! Acabei de me recordar de outra crise de choro que tive na escola quando minha professora de português queridíssima anunciou que no ano seguinte não ensinaria mais a nossa turma. Coloquei as mãos no rosto na hora e chorei, sem nem ter tempo de sair correndo da sala. Meus olhos sempre foram diarreias de lágrimas.

Eu amava Fábio Jr. [Aqui eu tenho CER-TE-ZA que muita gente fechou o texto!]. E minha mãe me contou da minha reação quando ela e painho me deram um LP deste cantor: desmaiei. Eu era uma criança totalmente breguinha! E sou uma adulta semi-brega e só não sou mais porque as pessoas de minha convivência me enchem de críticas a todo instante. Entretanto, a verdade é que eu sou romântica incurável, com todos os clichês e repetições que esta frase merece.

Morreram na mesma semana Wando e Whitney Houston e meu coração chorou um pouquinho. Se fosse antes, eu teria chorado como quando o cachorrinho foi atropelado, pois meu coração nada experimentado chorava indiscriminadamente por animais e cantores românticos-bregas. Depois de algumas decepções, foi o meu Áries que tomou as rédeas de certas atitudes minhas e, desde então, até em homem eu já bati! [Aqui, algumas pessoas vão dizer: barraqueira – com razão, foi um barraco, mas eu não estou nem aí e até hoje rio disso]. Não choro mais como antes, mas não me curei do romantismo raspador de tacho, pisador de jacas, afogador de mágoas. Sinto que há certa cronicidade nessa forma de sentir e se emocionar. Eu tento, minha gente, mas quando vejo já estou sentindo aquele arrepio de revés subindo pela coluna afora, passando pelo cangote e desembocando nos olhos. O cérebro nem se dá conta desse movimento.

Eu choro muito em casamento e no último que fui, uma das convidadas comentou depois com a noiva, que tinha uma moça de verde passando mal num dos bancos da frente [quem era?]. Eu chorei até desrespeitar a maquiagem – limpei os olhos com as costas da mão. Assim que eu soube desse comentário, chorei de rir. E também não mentirei que os símbolos dos laços formados entre os que se amam traduzem esta minha artéria femoral romântica. Qualquer escárnio a respeito disso me faz chorar quietinha, porque hoje em dia é brega sonhar com estas coisas, né? Imagine se importar!

Agora há pouco eu achei de ouvir a música tema do filme “O guarda-costas”. Sim, aquela música desgraçada que diz no meio “nós dois sabemos que eu não sou o que você precisa, e eu vou sempre amar você”. Chorei, mas descobri num insight, que o romance é alguma coisa de super fantasioso, super ideal, super demais e está aí um pedacinho do quebra-cabeça que explica porque diacho eu chorava tanto com coisas românticas: elas não são concretizadas em todos os detalhes na vida real. Não vai haver sempre um homem que tome a zorra de uma bala por sua causa, minha amiga. Mesmo assim, parte de mim jamais se apartará do fato de há alguém assim no mundo, deve haver, tem que haver! Eu me atiraria, gente. E ainda ia ouvir tocando ao fundo “você é luz, é raio, estrela e luar, manhã de sol, meu iá-iá, meu iô-iô + I will always love you”. 

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

NO DIA EM QUE A PM PAROU.


Salvador vive momentos de ápice, ondas de violência, tensão e medo. Creditamos todas estas sensações à greve da PM. Pois bem, depois que alguns homens, policiais militares, entraram em greve, há um pânico louco por essa cidade e só se vê tiros para todos os lados. Perdoem-me o trocadilho em momento inoportuno, tal qual as reportagens dos telejornais da Globo, que nadam em trocadilhos infames como “os caixões estão pela hora da morte”. Mas é fato que tiros estão sendo dados a esmo e muitas mortes já foram estatística e emocionalmente computadas; assim como também é fato que estamos lançando artilharia pesada sobre todo mundo, na busca de um culpado viável que amalgame todas as justificativas para esta guerra estar acontecendo. Políticos e policiais sendo colocados como alvos de nosso descontentamento.
E nós, com nossa ação política coalhada, somos responsáveis por que? A gente ama a sensação de segurança de nossos bairros chiques, mas esquecemos que na periferia essa guerra é sempre. A gente odeia greve de PM, mas esquece que estes trabalhadores se matam e matam todos os dias, recebendo um salário filho da p... pra enfrentar bandido com armamento muito mais pesado e sofisticado que o deles. E nessa hora, acreditamos, meus amigos, como crianças que inventam soluções mirabolantes para problemas graves, que somos peritos em segurança pública e entendemos de política como ninguém. Isso porque gritamos aos quatro ventos que esse ou aquele governo é culpado, corrupto e sei lá mais o que.
Ou é inocência ou é um paliativo para a mente culpada, mas xingar político por facebook nunca foi e nunca será comoção política! Que tal fechar sua Veja e sair nas ruas se juntando com outros trabalhadores em busca de salários mais dignos e condições dignas de trabalho? Que tal parar de xingar Dilma e se envolver com política a tal ponto que passe a entender que governo é uma das engrenagens desse todo e que você, meu amigo, não deixa de fazer parte desta sociedade só porque não votou em determinado governo. Esse pensamento tacanho é de um fundo egoísta e desarticulado de tal maneira que eu te convido neste instante a ser mais um responsável pela greve da polícia! Sim. Você está sendo governado não porque não escolheu esse ou aquele presidente, mas porque se negou a escolher fazer algo todas as vezes em que foi convidado a fazê-lo.
Por todas as vezes que você embarcou nas historinhas de direita e acreditou que movimentos sociais são para vagabundos que não gostam de trabalhar, você contribuiu para a greve da polícia. Todas as vezes que você pensou que a meritocracia era a melhor maneira de organizar a distribuição da riqueza de nossa sociedade, você contribuiu para a greve da polícia. Todas as vezes que você acreditou na democracia racial, você contribuiu para a greve da polícia. Porque todas as vezes que não conseguimos olhar para os lados e nos enxergar como iguais, contribuímos para que o parafuso, cansado de ser parafuso, queira um dia ser melhor. Sabe o que a polícia é chamada a fazer, meu amigo? Ela é chamada todos os dias para conter os excluídos do nosso sistema de livre concorrência, onde o mais apto pisa e explora o menos apto. Ela é chamada para matar os que tem como impedimento de subida uma pedra histórica amarrada aos calcanhares. Ela é chamada para manter a ordem. E quantas vezes você não disse essa frase? É ou não é? Manter a ordem. Mas vejam bem... esses policiais, que são trabalhadores, estão cansados. Para que eles continuem servindo à sociedade da maneira correta, mantendo tudo no lugar, é preciso que olhemos para eles como trabalhadores dignos que são.
Porque são eles, meu amigo, que agem na falta da política que nós todos não ajudamos a mudar. E somos convidados a fazê-lo antes do movimento urnístico. Somos conclamados pelo movimento do “Desocupa”, pelo movimento estudantil, pelo movimento dos Sem-Terra, Teto, Porra Nenhuma; movimentos estes que criminalizamos como estamos fazendo com estes policiais. Movimento de trabalhadores!
Constitucionalmente eles estão em motim. Constitucionalmente nós todos somos iguais, também. Então, vamos parar de hipocrisia, que esta veste rota não cobre mais nossas justificativas para continuar apontando o dedo, a arma, a culpa para D, E ou F [que são as classes que mais sofrem] e nos isentando da responsabilidade da participação social.
Respeite o trabalhador e se enxergue – se enxergue como tal. E só vou deixar mais um pensamento entre tantos outros não devidamente explicados em meu texto provocativo: se a categoria da polícia militar parou e causou isso, imaginem se os demais trabalhadores parassem...? E parafraseando o meu conterrâneo, Raul Seixas, eu digo: “essa noite eu tive um sonho de sonhador maluco que sou, eu sonhei com o dia em que a Terra parou”.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

JULIANA NÃO QUER AMAR? AMA, JULIANA, AMA!



Eu estava esperando Juliana amar pra eu voltar a falar bem do mundo. Tava querendo ver até onde iríamos aguentar: Juliana sem amar e eu sem falar bem da vida. Não suportamos por muito tempo. E eu não sabia, dona Juliana, que amavas tão bonito assim! Tão bonito que me faz conjugar o verbo todo enfiado na segunda pessoa do singular.

Não que Juliana tenha inventado um jeito outro mais bonito de amar, mesmo porque Juliana é igual a um bando de menina bonita que se vê por aí. Daquelas bonitas que são mais bonitas porque não tem certeza de nada – nem da beleza de si, nem do amor. Juliana, ah Juliana...! Amando, hein? Só você não sabia que podia ir fazendo isso tão bem. Fica a dica: nem sempre amiga mente pra te ver sorrir!

Ontem eu pensei que estava sem tripas e hoje vejo você assim, não tem como não rir, como não bendizer este mundo que faz Julianas encontrarem garotos que lhe possam – e saibam – amar. E eu estou feliz porque posso voltar a dar uma banana p’aqueles que vivem afiando os cascos nas navalhas de pessimismo – vejam, seus otários, Juliana ama!

Tão florida, minha menina... fazendo tudo que todo mundo faz, mas que é inédito todos os dias. Amor é gostoso como pão com ovo e café com leite. É bom ver você com fome – se acaba, viu Juliana! Mata tudo que estava te matando. E sua fome é tão justa e tão santa que me faz lembrar do amor que tenho, que sinto, que envergo como um vestido de verão.

Verei seus sorrisos mais sorridos e sua voz mais dengosa, suas mãos pequenas mais trêmulas e todos os românticos com mais razão. Verei o mundo com mais sabor, como se fora um bubbaloo de morango ou muitos deles numa boca só. Porque quando a gente é criança e quando dão vacilo, enfiamos uns três chicletes na boca de uma vez . E amor é assim guloso, né? Doce, gostoso, infantil e faminto.  E é muito feliz ver uma Juliana amando assim, pois quem não tem uma Juliana sorrindo por amor, precisa ter pra relembrar da vida fazendo ploc ploc entre os lábios e mostrando bem todos os dentes!

COMO É QUE ESCREVE?


Alguma coisa roubou minhas palavras das tripas. Não escrevo mais como antes. Não tenho mais aquela gana de ir vendo o papel desembranquecer. Tenho tido uma raiva dos gênios que escrevem coisas putaquepariulizadas e só faço ler facebook e outras modernidades.

Tenho medo de estar sem assunto, sem tesão e não vejo em canto nenhum algo que hasteie o mastro do meu vocabulário. Vai ver é porque eu tinha tempo de ver rosa no mundo e ver a vida não me pedir comprovante de residência. Eu tinha tempo de ir, em minhas tardes, na beira da praia e sentir o vento assanhar minha saia. Eu não beijava ninguém, eu comia papel xerocado.

Vai ver eu me achava uma pirralha ao entrar na faculdade e agora, ao final, sobreveio-me uns 200 anos no couro, algumas decepções e a certeza que meu QI saltou pra zero. Ou pode ser também a sensação de que fui sugada pela realidade e antevejo o riso dos desconfiados que diziam: “gente é a desgraça da gente”. Eu tenho medo de sorrir e ser presa por desacato à autoridade-desconfiança deste mundo cão. A regra é clara: plante seu olho nas costas!

Eu me afoguei numa poça de concretude e agora confesso que fui eu que estripei as linhas dos meus textos. Matei minhas rimas e joguei soda cáustica na linguagem. Estou caducando meu jeito de ser aos poucos, deixando na masmorra de sonhos minha alma criança e desse jeito é que não consigo escrever bonito. Toda vez que tento escrever, eu sinto minhas unhas grafando no asfalto das horas. Eu não tenho mais tempo de fazer as coisas fazerem sentido. Abro o olho, almoço, trabalho e janto. O alimento que engulo só me deixa faminta, o anseio de mudar me devora e eu penso por instinto, sacolejando entre os gados do coletivo lotado.

Talvez por isso eu não escreva mais como quem sonha, não sonho mais como quem pode, não posso mais como quem voa, não voo mais como quem escreve.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

ATRÁS DA PORTA

Atrás da porta tem barulho de vento, tem poeira, tem vassoura e grilos falantes. Ficam atrás da porta minhas vergonhas, anseios e coisas que não lembrava que tenho. Meu conservadorismo, minha mania superprotetora, meu jeito de cuidar com excessivo zelo, fica tudo atrás da porta.
Todas as coisas que vagam em meu peito, em minha mente e que não sei sobre mim se esgueiram atrás da porta querendo sair. Querem encontrar um jeito de combinar o que sou, com o que acho que pareço, o que vêem sobre mim e sobre tudo o que está atrás da porta.
Eu não sei muita coisa e nem posso mais dizer se não gosto de verde ou se não chupo limão, pois a cada coisa que sai detrás da porta percebo que há muito sobre mim velado, empoeirado ou que pode ruir. Esta que sou e que me lembro ser, parece uma casquinha morando pelo lado de fora do que está atrás da porta...

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

BSMP!!!

Hoje vi um vídeo de um pai que compete na modalidade triathlon com o filho deficiente. Quando acabou o vídeo, além da emoção pela demonstração de amor deste pai, veio em mim uma vontade de me espancar – como Jim Carrey no filme “O Mentiroso”.

O pequeno vídeo termina com uma frase mais ou menos assim: “se você quer algo, você consegue, basta que se decida por isso”. O rapaz estudou e fez faculdade. Caso não esteja enganada, ele não fala, a não ser com a ajuda de um computador. Falou que se fosse “normal”, colocaria o pai dele na cadeira de rodas e empurraria, como o pai faz com ele nas competições, retribuindo, desta maneira, todo o amor e dedicação que este pai lhe devota. Tudo isso me espanta – como eles são assim deste jeito? E, claro, que estabeleci a comparação comigo mesma, afinal de contas as minhas pernas vão bem, obrigada, meus braços estão legais – apesar dos músculos do tchau estarem ridículos – e eu falo pelos cotovelos. O que ele tem que eu não tenho?

É isso, ele tem uma robusta força de vontade. Ele se enxerga, mas não como os outros o vêem e sim como ele mesmo se vê. Ele olha pras limitações físicas e diz: “eu não sou vocês”. Ele tem coragem e tem medo, mas escolhe todos os dias a quem vai obedecer. É como se a vida dissesse um não para ele e diante disso só lhe restasse correr atrás do sim. E eu me pego sempre no talvez – por isso a vontade de me dar um sapeca iá-iá.

Tá, vamos lá, eu comigo mesma em frente do espelho, me diz aí meu eu, o que me impede de voar? O espelho respondeu com minha imagem refletida. Se ele virasse fumaça colorida e se transformasse numa cara de gênio e falasse que era a Branca de Neve, eu ia sair correndo e gritando: “minha vida é um conto de fadas, uhulll”. Mas não é; não existe esta parada sinistra de bruxa tramando contra mim, não existe a quem responsabilizar a não ser a mim mesma.

Não se apressem em pensar que estou na onda culpista, culposa, culpeira e vou parar por aqui com a constatação eficiente de que eu comando minha própria vida, pois isso cada um sabe – muito embora tantas vezes permita que outros assumam esse papel. Eu quero mais que prometer uma nova pessoa, eu vim dizer que outra de mim está nascendo e sem a violência da culpa por achar que tempo se perde. Isso sempre pareceu uma maluquice da zorra na minha cabeça: como podemos crer em eternidade e dizer que perdemos tempo? Aí é que não acredito mesmo nessa parada de viver 65, 79, 92 anos e achar que mereço um céu ou um inferno; e por este motivo me atrelar a um tal de “viver a vida intensamente” e me jogar em todas as portas abertas às sensações. Ou ficar me escondendo da vida com medo de perder a cobertura de frente pro mar de nuvens lá na casa de São Pedro. A Vida, para mim, é um fenômeno Infinito. E por isso não sinto culpa de não ter feito certas coisas antes.

Quando eu senti vontade de me bater depois do vídeo, foi dizendo a mim mesma: “acorda, viu? Agora você já está em condições, faça o que pode e você pode o que quiser, desde que mantenha firme o desejo”. Por motivos óbvios, não fui tão educada comigo mesma e não usei estes termos, foram outros e não me atrevo a transcrevê-los para vocês. O fato é que é a primeira vez que sinto um negócio por dentro, todo se bulindo e falando como a torcida do Bahêa: “Bora Sâmia Minha Porra!”.