terça-feira, 17 de janeiro de 2012

ATRÁS DA PORTA

Atrás da porta tem barulho de vento, tem poeira, tem vassoura e grilos falantes. Ficam atrás da porta minhas vergonhas, anseios e coisas que não lembrava que tenho. Meu conservadorismo, minha mania superprotetora, meu jeito de cuidar com excessivo zelo, fica tudo atrás da porta.
Todas as coisas que vagam em meu peito, em minha mente e que não sei sobre mim se esgueiram atrás da porta querendo sair. Querem encontrar um jeito de combinar o que sou, com o que acho que pareço, o que vêem sobre mim e sobre tudo o que está atrás da porta.
Eu não sei muita coisa e nem posso mais dizer se não gosto de verde ou se não chupo limão, pois a cada coisa que sai detrás da porta percebo que há muito sobre mim velado, empoeirado ou que pode ruir. Esta que sou e que me lembro ser, parece uma casquinha morando pelo lado de fora do que está atrás da porta...

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

BSMP!!!

Hoje vi um vídeo de um pai que compete na modalidade triathlon com o filho deficiente. Quando acabou o vídeo, além da emoção pela demonstração de amor deste pai, veio em mim uma vontade de me espancar – como Jim Carrey no filme “O Mentiroso”.

O pequeno vídeo termina com uma frase mais ou menos assim: “se você quer algo, você consegue, basta que se decida por isso”. O rapaz estudou e fez faculdade. Caso não esteja enganada, ele não fala, a não ser com a ajuda de um computador. Falou que se fosse “normal”, colocaria o pai dele na cadeira de rodas e empurraria, como o pai faz com ele nas competições, retribuindo, desta maneira, todo o amor e dedicação que este pai lhe devota. Tudo isso me espanta – como eles são assim deste jeito? E, claro, que estabeleci a comparação comigo mesma, afinal de contas as minhas pernas vão bem, obrigada, meus braços estão legais – apesar dos músculos do tchau estarem ridículos – e eu falo pelos cotovelos. O que ele tem que eu não tenho?

É isso, ele tem uma robusta força de vontade. Ele se enxerga, mas não como os outros o vêem e sim como ele mesmo se vê. Ele olha pras limitações físicas e diz: “eu não sou vocês”. Ele tem coragem e tem medo, mas escolhe todos os dias a quem vai obedecer. É como se a vida dissesse um não para ele e diante disso só lhe restasse correr atrás do sim. E eu me pego sempre no talvez – por isso a vontade de me dar um sapeca iá-iá.

Tá, vamos lá, eu comigo mesma em frente do espelho, me diz aí meu eu, o que me impede de voar? O espelho respondeu com minha imagem refletida. Se ele virasse fumaça colorida e se transformasse numa cara de gênio e falasse que era a Branca de Neve, eu ia sair correndo e gritando: “minha vida é um conto de fadas, uhulll”. Mas não é; não existe esta parada sinistra de bruxa tramando contra mim, não existe a quem responsabilizar a não ser a mim mesma.

Não se apressem em pensar que estou na onda culpista, culposa, culpeira e vou parar por aqui com a constatação eficiente de que eu comando minha própria vida, pois isso cada um sabe – muito embora tantas vezes permita que outros assumam esse papel. Eu quero mais que prometer uma nova pessoa, eu vim dizer que outra de mim está nascendo e sem a violência da culpa por achar que tempo se perde. Isso sempre pareceu uma maluquice da zorra na minha cabeça: como podemos crer em eternidade e dizer que perdemos tempo? Aí é que não acredito mesmo nessa parada de viver 65, 79, 92 anos e achar que mereço um céu ou um inferno; e por este motivo me atrelar a um tal de “viver a vida intensamente” e me jogar em todas as portas abertas às sensações. Ou ficar me escondendo da vida com medo de perder a cobertura de frente pro mar de nuvens lá na casa de São Pedro. A Vida, para mim, é um fenômeno Infinito. E por isso não sinto culpa de não ter feito certas coisas antes.

Quando eu senti vontade de me bater depois do vídeo, foi dizendo a mim mesma: “acorda, viu? Agora você já está em condições, faça o que pode e você pode o que quiser, desde que mantenha firme o desejo”. Por motivos óbvios, não fui tão educada comigo mesma e não usei estes termos, foram outros e não me atrevo a transcrevê-los para vocês. O fato é que é a primeira vez que sinto um negócio por dentro, todo se bulindo e falando como a torcida do Bahêa: “Bora Sâmia Minha Porra!”.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

CAMINHA ALMINHA.



A alma caminha, desde muito, vazada da mão de Deus. “Não estou pronta”, grita minh’alma. E não está a sua também. Nem a sua, nem a minha, nem a de ninguém. Mistério profundo o de querer descobrir que fim a alma tem. Tem?

Vai se esgueirando entre as fendas da estrada, se forjando em pó e mágoa, se lapidando na dor e tomando um brilho próprio, pelejando as próprias asas como lagarta fogueadora – queima, se arrasta mole e feia e depois borboleta se mostra voadora.

Ampara a leira de plantio livre, arbitrando as vontades do próprio caminho – se de vagos clarões faz sua estrada, não reclama os escuros sustos do destino. A alma vai se fazendo nela mesma, do material em que se transforma ao viver – e é só o que se pode fazer; não há nada além de ser alma. Por isso não há igual alma no mundo: não pesam os mesmos medos, não cheiram os mesmos risos, não sangram os mesmos ais. O máximo que se pode ter, em termos de almas iguais, é uma que tenha a ponta do lençol que se encaixe na assimetria do outro coração [porque em mim é lá que alma habita].

E hoje amanheci a me questionar, de onde nascem as almas que não querem andar? Quantas lágrimas molham uma alma? Que dor é essa que tem a sua e na minha não tem? Por que há mofos distintos nas barras dos nossos lençóis? Numa vã tentativa de entender o que vai na trouxinha amarrada nas costas da alma de alguém; mas não dá, não é possível ver além do próprio lençol. Outras coisas é que são possíveis e o Amor é o pai de todas elas; destas que redimem, que aquecem, que confortam, que abrigam, que ensinam, que unem e ajudam a caminhar, alma.