quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

COMO É QUE ESCREVE?


Alguma coisa roubou minhas palavras das tripas. Não escrevo mais como antes. Não tenho mais aquela gana de ir vendo o papel desembranquecer. Tenho tido uma raiva dos gênios que escrevem coisas putaquepariulizadas e só faço ler facebook e outras modernidades.

Tenho medo de estar sem assunto, sem tesão e não vejo em canto nenhum algo que hasteie o mastro do meu vocabulário. Vai ver é porque eu tinha tempo de ver rosa no mundo e ver a vida não me pedir comprovante de residência. Eu tinha tempo de ir, em minhas tardes, na beira da praia e sentir o vento assanhar minha saia. Eu não beijava ninguém, eu comia papel xerocado.

Vai ver eu me achava uma pirralha ao entrar na faculdade e agora, ao final, sobreveio-me uns 200 anos no couro, algumas decepções e a certeza que meu QI saltou pra zero. Ou pode ser também a sensação de que fui sugada pela realidade e antevejo o riso dos desconfiados que diziam: “gente é a desgraça da gente”. Eu tenho medo de sorrir e ser presa por desacato à autoridade-desconfiança deste mundo cão. A regra é clara: plante seu olho nas costas!

Eu me afoguei numa poça de concretude e agora confesso que fui eu que estripei as linhas dos meus textos. Matei minhas rimas e joguei soda cáustica na linguagem. Estou caducando meu jeito de ser aos poucos, deixando na masmorra de sonhos minha alma criança e desse jeito é que não consigo escrever bonito. Toda vez que tento escrever, eu sinto minhas unhas grafando no asfalto das horas. Eu não tenho mais tempo de fazer as coisas fazerem sentido. Abro o olho, almoço, trabalho e janto. O alimento que engulo só me deixa faminta, o anseio de mudar me devora e eu penso por instinto, sacolejando entre os gados do coletivo lotado.

Talvez por isso eu não escreva mais como quem sonha, não sonho mais como quem pode, não posso mais como quem voa, não voo mais como quem escreve.

2 comentários:

Saulo Dourado disse...

Como diria um velho conhecido num estador de torpor, "eu fico impressionante!". É isso, a gente perde as palavras e deixa as suas.
(Não, não pare, fale de uma maça na cesta como fazem os pintores realistas, ou de um caso da infância, qual recomenda Rilke em "Cartas a um jovem poeta", mas não pare...)

Marigil Vieira disse...

Poxa... me sinto exatamente assim... ultimamente também não tenho conseguido!